Thiago 29/03/2023
Uma bela crônica histórica no berço do Brasil colonial
Sempre que busco uma resenha sobre “1565” do Pedro Doria uma crítica sempre recorrente é de que a obra se concentra, demasiadamente, no Rio de Janeiro. E que isso seria uma demérito à escrita já que a proposta é abordar as primeiras décadas da colonização no Brasil. Mas posso atestar que esse é um apontamento não exatamente sincero. E mesmo que o fosse, seria totalmente justificável.
Em “1565” Pedro Doria trata muito do desenvolvimento do Brasil colonial em seu berço, mas focando na expansão exploratória portuguesa na região sudeste. E sim, principalmente ao espaço geográfico que hoje chamamos de Rio de Janeiro. Contudo, a todo momento os enlaces do texto buscam referência ao que acontece na capital Salvador e desce até aos primeiros anos das incursões Bandeirantes na Província de São Vicente e o que viria a se tornar São Paulo.
Portanto o livro faz um recorte regional bem carioca, algo que o autor assume-se sendo como um “apaixonado da gema”, mas nem por isso despreza o restante do território como um todo. Aliás, esse é um livro que ajuda a entender um pouco do processo e instalação das Capitanias Hereditárias e como elas eram geridas tanto pelo sucesso quanto pelo seus fracassos.
Outro ponto interessante são as passagens sobre personagens indígenas e seu relacionamento com os recém chegados europeus. Como o homem branco e o nativo foram disputando e integrando espaços, seja pela convivência, seja pela violência colonizadora. Termos, nomes e hábitos que hoje fazem tão parte do cotidiano mas que buscam suas origens nessa miscigenação secular.
Fundamental também os trechos que tratam do papel da igreja e seu relacionamento com o processo colonizador. Principalmente o trabalho dos jesuítas na conversão e até proteção dos povos indígenas sob sua tutela. Sem esquecer também a marcante força de trabalho escravista e como muito do que vemos hoje estruturalmente na sociedade contemporânea tiveram aqui, nesse período, todas as suas raízes.
E claro, tudo aqui contado sob o ponto de vista de alguém que pratica o jornalismo científico histórico. Respeitando as obras e conceitos fundamentais através de uma rica bibliografia mas também com uma narrativa menos acadêmica e, às vezes, até como um cronista in loco do período.
Talvez um fator negativo ao livro seria a falta de mais conteúdo ilustrativo como mapas, fotos e retratos que ajudem a fixar melhor cada personagem e também posicionar territorialmente a trajetória do texto. Isso nem de longe é um defeito, mas com certeza enriqueceria ainda mais o trabalho do autor. Recomendo demais “1565” tanto como um recorte temporal para quem gosta de História do Brasil e, principalmente, para os cariocas que hoje pisam em um solo tão rico de sua própria história.