Moons 06/06/2016
Memórias junto ao som do Canto da Sereia e o Sorriso do Lobisomem
Eu posso declarar com toda a certeza que Eva Canning teceu uma tarde chuvosa só para que eu viesse aqui, ainda encharcado - depois de visitá-la nas profundezas do meu mar pessoal -, tecer uma ode à ela.
Desde a primeira linha eu bem soube este seria um livro que abalaria todas as frágeis estruturas do que chamamos de alma, mas há uma coisa que preciso deixar clara sobre ele: o mundo dos leitores está dividido entre quem ama e entre quem odeia A Menina Submersa. Não há meio termo. Não há como ter.
India Morgan Phelps, ou simplesmente Imp, ou simplesmente Inverno, testa sua paciência desde a primeira oscilação. Como fator óbvio, eu tive de me adaptar, ler ao sabor de suas intempéries, mas deixo claro que não consegui me irritar, justamente porque às vezes ela é um personagem tão verossímil que dói. E dói de um jeito meio inexplicável e claro, profundo, bem onde a gente se identifica ferozmente com a mesma.
Há uma intrincada rede de referências na trama e foi justamente por isso que o li de forma lenta e apreciativa.
E foi assim que nos últimos dois meses acompanhei a vida, as perdas, as memórias e a corrida esquizofrênica para dentro de si mesma (de Imp). Eva Canning também nos acompanha nessa incursão meio macabra, meio poética, e ela, por si só, é um misto de Sereia, Fantasma e/ou mulher lobo. O que ela realmente é, não sabemos, ou talvez eu saiba, mas não queira contar para não contaminar as águas da sua concepção sobre ela.
Porque é isso: Eva Canning sempre estará pronta para cantar ou uivar para ti, para que possa ou te seduzir ou te devorar num único movimento.
Eu não vou me estender, mas quero deixar claro que se você espera algo linear, você não encontrará. Não nesse livro, pelo menos. Porque foi lendo ele que eu entendi que nenhuma história tem começo e nenhuma história tem fim. Começos e fins podem ser entendidos como algo que serve a um propósito, a uma intenção momentânea e provisória, mas são, em sua natureza fundamental, arbitrários e existem apenas como uma ideia conveniente na mente humana. As vidas são confusas e, quando começamos a relacioná-las, ou relacionar partes delas, não podemos mais discernir os momentos precisos e objetivos de quando certo evento começou. Portanto, todos os começos são arbitrários.
E para concluir, digo que simplesmente não consigo parar de ouvir o som do mar quebrando na rebentação desde quando fechei a última página desse livro.
Eu acho que muitos dos meus fantasmas agora, enfim, se afogarão na enseada em que eles teimam em sempre emergir.
E garanto: não vejo corvos. Pelo menos não aqui.