Julhaodobem 08/03/2021
Resenhando Porno Chic
Livros são a porta para o conhecimento dentro de um mundo que criamos em nossa mente sem percebermos, e quando damos conta você recebe o título mais gratificante, é chamado de leitor ou leitora. Quem esta entrando no mundo da leitura provavelmente já ouviu esta explicação em vários formatos, na vida de um leitor estamos sujeitos a várias transformações de leituras em uma simples virada de página. Ler Porno Chic foi uma delas, não foi pela putaria fantasiosa e sem ligação com a realidade como Cinquenta tons de cinza ou pela pedófilia mental em Lolita, Hilda Hilst possue uma história de vida na literatura brasileira que se tomarmos a devida atenção perceberemos que a tetralogia pornográfica de Hilda possue um significado simbólico tanto em sua literatura, como era ser uma mulher escritora e que pensava entre os anos 50 e 70.
Depois de ter publicado em torno de 30 livros desde os anos 50, até os anos 80 ela não teve nenhum reconhecimento de seus escritos como uma verdadeira literatura brasileira. Era algo estranho, as pessoas sabiam quem era Hilda Hilst mas nunca leram seus livros, era criticada por criticos ou pessoas do ramo da literatura mas nenhum nunca comprou um livro seu. Ela participava do projeto da faculdade Unicamp para escritores residentes, um projeto da instituição para colocar os estudantes que se interessavam pela literatura mais perto de escritores que estavam a muito tempo no ramo da escrita, mas ninguém conversava ou chegava em sua mesa para tirar dúvidas pelo seu comportamento sincero até demais, além de terem medo dela. Com quase 60 anos, Hilda jogou tudo para o alto e disse que dali em diante só escreveria livros pornográficos pois com mais de 30 livros publicados não conseguiu o merito que merecia, uma forma de dar uma "banana aos editores" como ela falaria algum tempo depois em uma entrevista a TV cultura. Não teria conhecido Hilda Hilst sem um pequeno empurrão, 2020 foi um ano caótico e 2021 ao que me parece é a parte dois, no meio de ansiedades e perturbações conheci o clube do Livro de Taty leite, do canal Vá ler um livro no YouTube, onde li com o clube Quarto de despejo de Carolina María de Jesus. Com o clube do livro aprendi a história da Hilda e o porque na metade da sua vida ela quis escrever textos tão fortes, o que me fascinou depois de estranhamentos e sensações eróticas que a tetralogia pornográfica é muito mais que paus, bocetas e zoofilia, a autora consegue jogar a sua vontade e a raiva escondida de uma escritora que trabalhou duro para ser reconhecida mas que acabou virando aos olhos dos editores uma escrita paria.
Somente compreendi este livro com o clube do Livro de Taty leite, sem ele eu nunca leria este livro, provavelmente correria dele. Portanto deixo aqui um Jaba do bem, convido você a participar e ler conosco literatura totalmente brasileira e se aventurar nas páginas, conversas com mais de 700 pessoas que exalam suas energias literárias que vem de todo o Brasil e dos brasileiros que estão pelo mundo, deixo aqui o link do nosso grupo do telegram: t.me/lendojuntos
Com Porno Chic, a edição que junta toda a tetralogia, tive muitas sensações e leituras inesperadas, começando com O caderno rosa de Lort Lamby, uma menina de 8 anos discursando em seu diário sobre suas aventuras sexuais com homens mais velhos em formato de fantasias colocada por eles. No começo confesso que achei repugnante a forma com que começou o livro, o ato da pedofilia é algo que estamos vendo infelizmente a cada dia mais em jornais ou redes sociais, não coloco como algo comum mas em primeiro momento achei que era mais uma história grotesca de pedófilia, só que aos poucos fui entendendo muito mais que atos carnais. O formato em diário por mais que tenha erros gritantes de gramática, são compreensíveis pois percebemos que é para mergulharmos na narrativa e acreditar que seja realmente uma criança que esteja escrevendo em sua mais simples inocência, visando o formato imaginativo do sexo em sua visão infantil. No fundo somente as pessoas de mente aberta irão entender como eu, não ha nenhuma chance de uma Lory Lamby ser real com as ideias que são mostradas no livro, percebi que quando entendi a história virou-se uma chave em minha mente, juntando com o objetivo da autora de escrever o caderno rosa, percebe-se que realmente ela está dando uma "banana filosófica" aos editores que tanto a julgavam e consequentemente dificultavam a publicação de seus livros pelo brasil. O caderno rosa de Lory Lamby foi para mim talvez a minha leitura mais inesperada até o momento, somente depois de termina-lo olhei para o teto, sorri com uma simples cara de deboche e saquei a inteligência de Hilda Hilst em enganar, seduzir o ramo editorial com um livro em formato de protesto sem que percebam, tornando-os meros peixes caindo de boca em um ansol disfarçado.
Dentro do caderno rosa, há uma história junto que provavelmente é a história mais erótica em minha percepção nesta edição de porno chic, O caderno negro. Nele li uma fantasiosa perspectiva que em partes tem sua realidade, só que estrapola a um nivel que em algumas partes o meu nível de sanidade possa ter baixado por imagens eróticas muito descritivas mas que no fundo, entre quatro paredes, portas trancadas com cadeados e persianas fechadas, há pessoas que usurfluem de prazeres que a nossa sociedade "moderna" condenaria. Não irei tocar no quesito religião pois ja estamos cansados do mesmo discurso, portanto estou convicto que estamos a par deste assunto. No caderno negro percebi em alguns aspectos como o ato sexual, por mais que tenha suas conclusões diferentes, é um ato normal a ser feito, obviamente Hilda coloca seu toque para deixar seus leitores envergonhados, algo que só ela sabe fazer. Vendo por outro lado achei, com excessão de alguns acontecimentos carnais, a saciadez sexual mostrada é algo meramente realístico, quem lê acha repulsivo pois praticamente não se fala sobre o prazer sexual em lugares do nosso cotidiano, colocando o sexo como aquele velho tabu, portanto quando lemos fantasias como Cinquenta tons de cinza achamos aquilo normal mas quando nos deparamos com uma Hilda Hilst achamos repulsivo, mesmo sendo isto talvez a realidade do prazer do coito. Com uma leitura filosófica colocada com simples falas ou um nome de um personagem que remete personagens da filosofia e da história antiga, ao entender isto abre-se uma ligação paralela com o bacanal que acontece ao longo desta narrativa para algo de pura filosofia.
Passando para Contos de escárnio, depois de ter lido o caderno rosa e o caderno negro, este pareceu-me o mais leve até aquele momento, talvez tenha sido por causa de já estar acostumado com a leitura e a escrita de Hilda Hilst que já tinha me causado todo o estranhamento possível com o livro anterior, mesmo assim o teor pornográfico continua em Contos de escárnio. Por mais que em certas partes mais separadas e com muito humor negro, algo que transforma simples atos nos personagens em tirar boas risadas com o contexto que é criado ao longo da história com doses de filosofia. A estética da arte está muito presente por meio de uma personagem que suprime até um certo ponto suas angústias e vontades por meio de uma tela para pintar obras de arte. Em contra partida o protagonista me faz lembrar o típico mulherengo fracassado socialmente mas que esconde-se por meio do sexo a pressão de ser alguém no mundo. No meio de tudo isto mais uma vez está presente o manisfesto da autora em nunca ter recebido o merito que merecia por meio de um personagem que é o escritor, algo que enquanto lia balançava-se com a narrativa dos três personagens, que me proporcionou olhar aspectos da sociedade de uma forma deprimente mas escondido por formas de prazeres sexuais ou vocações mal resolvidas. Contos de escárnio para mim foi a forma mais "saudável" de Porno Chic, é claro que o sexo e a putaria continuam mas se desprendem totalmente com o tabu como os textos anteriores e deixa fluir como um gozo em uma obra de arte. Quando terminei fiquei com vontade de ler um livro longo só com estes três personagens, tanto pela forma de carisma como suas formas utópicas com pontos de realidade de ver o mundo a sua volta.
Com cartas de sedutor a leitura mais leve continua, claro que a pornografia sempre é uma parte importante que paira entre a história. O formato de cartas é uma grande peculiaridade da obra, somente vemos as cartas do personagem principal, sem nunca ver a visão do remetente, algo que achei fascinante pois me fez refletir se a outra pessoa era realmente tudo aquilo que o destinatário se referia e qual seria a resposta para com que sempre tenha respostas tão intimas que ao longo da história era revelado seu passado. A dinâmica feita com cartas sempre achei algo difícil de ser condensado em um livro, além de ser tediante. Mas com os aspectos colocados pela autora remonta uma história que há referências de sua própria vida com pequenas frases ou pensamentos dos próprios personagens, fazendo-me refletir sobre temas da sociedade de uma forma engraçada, sendo jogado em sua forma crua e sem discursos muito elaborados. Estou certo que foi uma leitura rápida e de fácil compreensão pois até aquele momento da leitura já estava totalmente dopado de Hilda Hilst.
Com o último "gostinho" de Porno Chic, Bufólicas é um pequeno compilado de alguns poemas da Hilda com histórias eróticas servindo como uma risada final depois de ler todo o livro, algo que a autora consegue fazer muito bem enquanto rima com palavras de muita putaria nos fazendo refletir de assuntos sexuais de uma forma que somente ela sabe fazer. Com Porno Chic tive alguns desafios, além de talvez ter escrito a maior Resenha de minha vida até agora, me possibilitou aprender uma literatura totalmente nova mais centrada, por incrível que pareça, na filosofia. Com temas de sexo mergulhei na vida de uma mulher muito afrente de seu tempo, uma escritora que não tinha limites para expressar seus pensamentos depois de um certo tempo, com isto talvez Lolita tenha perdido seu posto de livro mais aleatório que eu li para Porno Chic, pois diferente do primeiro este é um livro Brasileiro que crítica os próprios Brasileiros. Por mais que tenha sido escrito em tempos ditatoriais ele traz uma mensagem poderosíssima que eu, um pequeno jovem de 19 anos que sofreu apenas 15% da vida não conseguiria explicar totalmente a filosofia de Hilda Hilst, mas o pouco que compreendi para a minha idade entendi temas e suas discussões que provavelmente nunca iria pensar. Porno chic é sem sombra de dúvida um livro que deveria estar no ensino médio, nas ruas,nas salas de estar, nos hospitais e nos banheiros, principalmente nos banheiros de jovens garotos e garotas em sua calorosa puberdade.