PorEssasPáginas 30/09/2015
Resenha: O Gigante Enterrado - Por Essas Páginas
Imaginei que O Gigante Enterrado não seria uma leitura fácil para mim: ele tinha toda a cara de um livro que sairia da minha zona de conforto, e realmente sai. Alta fantasia, com muita descrição e escrita poética: tudo isso pode ser lindo, mas não é exatamente minha praia. Além disso, dos livros de autores japoneses, venho de uma decepção literária/um livro que quase estou abandonando, que é Battle Royale (longa história). Mesmo assim, não resisti e quis ler O Gigante Enterrado: a trama me instigou e a edição da Companhia das Letras é simplesmente primorosa. Ainda bem que insisti: o livro é nada menos que belíssimo, uma história de amor emocionante sobre a importância das memórias, mesmo as mais dolorosas.
O Gigante Enterrado é mais do que uma história de alta fantasia e foi isso que me conquistou; é um livro sobre, essencialmente, amor, perdão e lembranças. Em uma terra devastada pela guerra, em meio a uma paz frágil após a morte do rei Arthur, povoada por trolls, ogros, dragões e outros seres fantásticos, esse simpático casal de idosos, Axl e Beatrice, resolve fazer uma viagem difícil e audaciosa em busca da aldeia do seu filho, que há muito não encontram. Para completa, há essa névoa misteriosa que encobre as memórias das pessoas, sejam elas felizes, tristes, de amor ou de rancor. E é isso que mais aflige o casal: a perda de suas lembranças mais preciosas. Sua jornada, portanto, não é apenas em busca do filho, mas em busca de si mesmos.
Ler esse livro é como montar um quebra-cabeças; há peças por todo canto, nas mais diversas vozes. E não pense que o autor facilita as coisas para você e faz com que todas se encaixem por si mesmas: essa é a sua função, leitor, enquanto descobre essa história junto com os próprios personagens. A impressão que dá é que tudo passa num devaneio, como se a névoa do livro também afetasse o leitor.
Os personagens são extremamente ricos, tanto em personalidade quanto em carga emocional; além de Axl e Beatrice, conhecemos, junto com eles, outros personagens que cruzam sua jornada: um guerreiro, Wistan; um menino cheio de segredos, Edwin; um cavaleiro do próprio Arthur, tão idoso quanto o casal, sir Gawain. Todos eles trazem sua própria voz e riqueza à trama, que é contada em primeira, segunda e terceira pessoa, com vários narradores. Como disse, um verdadeiro quebra-cabeças.
É claro que, como não é uma leitura das mais confortáveis para mim, demorei um pouco para terminar de ler o livro e emperrei em algumas partes, que eram bastante descritivas ou poéticas, com diálogos cheios de palavras floreadas. Porém, sei bem que, nesse caso, o livro não poderia ser escrito de outra maneira; é isso que o torna ainda mais bonito, e mesmo que não seja minha zona de conforto, apreciei a leitura.
Aos poucos as linhas tênues de lembranças se desenrolam e o leitor começa a compreender o livro de fato, mas não ouso dizer que entendi completamente as intenções do autor. Não é um livro fácil de ler, certamente, mas o todo dele compensa: o final, então, me levou às lágrimas, uma metáfora extremamente bela e emocionante. Não é um livro para se ler de uma tacada só, mas para ser saboreado, lentamente, como uma refeição refinada, daquelas que você fará poucas vezes na vida.
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