GioMAS 15/10/2022
A Mansão Belasco engole os desavisados.
Não é aconselhável comparar obras de maneira vulgar, cada livro é único, com propostas diferentes, inseridos, muitas vezes, em contextos tão diversos que fica impossível traçar um paralelo entre eles. Porém, quando você se propõe, assim como eu, a ler por um mês inteiro obras de um mesmo gênero, a comparação, ainda que simplória, é quase inevitável. As referências pairam em nossa mente e, inconscientemente, procuramos em uma narrativa elementos presentes em outra, acumulando sensações literárias e somando experiências ficcionais. A comparação, neste contexto, vem para somar e não para limitar os horizontes do leitor.
Hell House é um livro completo em si mesmo, não há dúvidas, mas apresenta uma proposta que não se confunde com a de outras obras do mesmo gênero. Pitaqueira que sou, sem o domínio linguístico e a bagagem dos críticos genuínos, optei pelo caminho mais simples, qual seja, descrever aquilo que Hell House não é, para, em seguida, respeitadas as minhas limitações de leitora leiga e eventual, tentar expressar tudo aquilo que essa completa e muitíssimo bem elaborada obra é, pautando-me, é claro, nas minhas expectativas iniciais, interpretação geral e contato com obras do mesmo gênero. O pitaco tem essa liberdade poética, não é mesmo?! Não demanda extensa pesquisa (no meu caso, nenhuma rsrs) ou embasamento real, conta apenas com a beleza ingênua do "achismo" bem intencionado, ficando perdoada, desde já, qualquer incongruência.
Pois bem. Hell House não é entretenimento para crianças, não visa atingir o público infantojuvenil ávido por reviravoltas intensas e sustos descomunais, não! É sóbria, linear e com nuances científicos. Isso mesmo, a obra explora conceitos técnicos da parapsicologia, servindo-se, a cada uma de suas passagens, de elementos investigativos dos fenômenos paranormais e psíquicos. Por isso, não espere por uma narrativa como a de "Depois", "IT, a Coisa" ou "Trocas Macabras". Não há elementos de ficção fantástica e não tem aquele tom descontraído ou leve. É um livro pesado, tanto no conteúdo, quanto na abordagem.
Para aqueles que anseiam por terror psicólogico, este também não é o livro mais adequado. Hell House não apresenta dualidade extrema como os clássicos "A volta do parafuso" ou "A assombração da casa da colina", nos quais o aspecto psicológico se sobrepõe ao restante, fazendo com que o leitor questione, a todo momento, a sanidade dos envolvidos. Sem dúvidas, Richard Matheson explora a concepção entre a percepção particular e a realidade, introduzindo aspectos como a distinção entre sexualidade e depravação e os impactos psicológicos da privação dos desejos, mas não há apronfrundamento suficiente para alocar sua obra neste universo do terror embasado na neurose. Cada um dos personagens têm motivações subjetivas que orientam suas ações, mas não alteram efetivamente o fluxo da narrativa.
Os fenômenos paranormais não são tão intensos e assustadores como se vê em "Horror em Amityville". A interação dos personagens com o mal ocorre de forma mais sóbria, até porque, com exceção de Edith, são especialistas habituados com o espectro fantasmagórico que se dispõem a enfrentar.
Não é um livro de demônios. O mal decorre da ação humana, ainda que seja na esfera do não palpável, da energia não encarnada. A atmosfera da Mansão Belasco reflete as perversões humanas, nada mais, o que afasta a obra de clássicos como "O Exorcista", "666 Limiar do Inferno" ou "O bebê de Rosemary".
Por fim, indico a leitura para os amantes de terror, ansiosos por passagens clássicas, narrativa linear, objetiva, porém densa, personagens bem construídos e com forte obstinação, induzidos a questionar a natureza científica dos eventos paranormais.
Sejam bem vindos à Mansão Belasco, onde você pode ser a origem de todo o mal.