Everything but the books 21/11/2015
Quem nunca assistiu ou ouviu falar de um filme de zumbi? Bom, nos moldes de um apocalipse zumbi, confesso que nunca tinha imaginado que os antagonistas da história pudessem ser os animais.
Lembro que gostei muito quando li a sinopse de Zoo. Nunca tinha lido nada do autor, mas o coloquei em minha interminável lista de livros que gostaria de ler.
Um dia, passando pelos livros no e-reader pra ver o que me chamava atenção, resolvi dar uma espiada em Zoo e, gente, não consegui mais largar. E olha que não é um livro pequeno.
Zoo começa contando a história de Jackson Oz, um biólogo que desenvolveu a teoria do CAH (Conflito Entre Animais e Humanos), que basicamente dizia que o comportamento dos animais estava mudando em todo o mundo para pior, com cada vez mais espécies começando a mostrar comportamentos hiperagressivos em relação aos seres humanos.
Oz tem um chimpanzé, chamado Attila, que ele resgatou de um laboratório que fazia experimentos com animais, e é seu companheiro de apartamento. Ele era um brilhante aluno do doutorado até que passou a observar os eventos que viriam a se tornar a sua teoria CAH, mas ninguém acreditou nele. Ele largou a faculdade e passou a se dedicar a tentar mostrar ao mundo as mudanças que estavam acontecendo. Mesmo com todas as evidências, ninguém lhe dava crédito. Aliás, ele era ridicularizado. Mas ele insistia, principalmente porque, mesmo estudando o assunto a fundo, ele não conseguia encontrar o porquê da mudança de comportamento nos animais.
Quando dois leões, considerados calmos, do zoológico de Los Angeles matam seu tratador e fogem, causando ainda mais mortes, Oz percebe que é hora de agir antes que as coisas saiam ainda mais do controle. Ele vai para a África encontrar um contato seu e daí as coisas vão de mal a pior em direção ao apocalipse porque a “doença” deixa de ser observada apenas entre os grandes mamíferos e passa a atacar também os animais menores e domésticos.
Cinco anos se passam e nem Oz nem os demais cientistas descobriram a causa do surto. Oz, agora casado e com um filho, tem ainda mais motivos para lutar com unhas e dentes para parar o fenômeno e restaurar o mundo ao status quo.
O mundo estava se tornando um zoológico, mas sem jaulas.
"Era mesmo um zoológico, pensei, fechando o chuveiro, observando a rua abaixo pelas grades da janela. Só que agora começava a parecer que o Homo sapiens era o único animal confinado em jaulas."
Não que as causas que levam os animais a atacarem os humanos de forma totalmente fora do normal seja o grande segredo da história (pensando bem, nas de apocalipse zumbi também não), até porque, apesar de os cientistas terem demorado para descobrir, era algo que estava debaixo do nariz de todo mundo, mas até descobrirem foi uma matança brutal.
Tal como num apocalipse zumbi, que as pessoas demoram a entender e aceitar que seu parente, a pessoa que você ama, não está mais pensando racionalmente e só quer devorar você, temos no livro os animais (muitos domésticos ou normalmente não prejudiciais, como golfinhos) lançando-se sobre os humanos como se eles fossem uma presa à qual eles não pudessem resistir. Só que até a pessoa entender que seu doce cachorrinho tem como único objetivo matá-lo, a pessoa já era.
"Vamos sobreviver porque, embora tenhamos estragado tudo, temos a esperança, a fé e a vontade de melhorar o mundo, para nós e para os que amamos.
Melhorar o mundo é o que nós fazemos.
Será?
Não sei.
Talvez."
Como eu disse, a escrita de James não me era familiar, mas a tensão que escorre das páginas e o inevitável olhar (aterrorizado) de lado para o seu melhor amigo de quatro patas garantem uma leitura fluida e bons sustos. Os capítulos curtos também ajudam a manter o suspense e a prender o leitor no bom e velho ‘só mais um capítulo’, sendo que os narradores são diversos: Oz, terceira pessoa para Attila e para ataques ao redor do mundo. Eu praticamente me senti dentro da história porque o mundo retratado ali, o pré-apocalipse, é exatamente como o nosso.
Uma questão interessante é que a gente também para pra pensar no quanto somos dependentes de tecnologias que até alguns anos atrás vivíamos muito bem sem elas. Mas, hoje, parece que não sobreviveremos sem essas facilidades. E aí reside outro ponto de tensão na história: chega-se a uma solução, ainda que temporária, para o problema e todos comemoram porque não há mais ataques. Mas aí o comodismo nosso de cada dia e a falsa sensação de segurança se instalam e tudo volta à estaca zero. Se pensarmos bem, apesar de uma premissa inteligente, mas difícil de acontecer, temos várias outras situações semelhantes no nosso dia a dia. Quem nunca ouviu, por exemplo, sobre os efeitos nocivos de alguns produtos à camada de ozônio? Há conferências, os cientistas alertam e passamos um tempo sendo mais cuidadosos, mas aí tudo volta à estaca zero depois de um tempo; tapamos o sol com a peneira.
É, o ser humano, em alguns aspectos, parece não aprender mesmo. :/
"Os sons dos geradores foram seguidos por gritos e rajadas de tiros. Será que éramos assim tão estúpidos? Sim, parecia que sim.
Quantos ainda morreriam antes que aquela guerra acabasse?, pensei, já no terminal lotado do Aeroporto Internacional de Hancock. Eu não sabia. Ninguém sabia.
Já houve muitos suicídios, principalmente entre o pessoal de Washington – senadores e deputados acostumados à vida fácil. Agora não existe mais vida fácil."
Confira esse trecho bem tenso da mudança entre os animais sem o agente causador do surto para, após a volta dos velhos hábitos das pessoas, a hiperagressividade dos animais, inclusive Attila, o não mais tão dócil e melhor amigo de Oz. É sombrio, chocante e triste:
Em seu rochedo ensolarado no Central Park, Attila acorda. Tenso. Muito tenso agora. Sente a adrenalina se acumulando nas veias, bombeando o coração, mandando sangue para o cérebro e os músculos. O clarão de energia. Dendritos, sinapses disparando. A sensação invade o corpo, distorcendo as estruturas moleculares cerebrais. A pressão sanguínea aumenta.
A boca fica seca e ele começa a suar. Os pelos das costas se eriçam. Attila está se preparando para atacar. Algo disparou o impulso de ataque em seu cérebro e deixou o interruptor ligado. À medida que a irritação se intensifica, a respiração fica entrecortada, pesada, e se transforma num resfolegar sonoro, quase um rosnado.
O cheiro no ar voltou, chamando-o, arrastando-o. A fêmea ao seu lado também está agitada, os olhos brilhando de uma raiva ansiosa. Quando ele desce das pedras, os animais já voltaram. Espalham-se pela quadra de softball como um tapete vivo. A horda está maior e mais sedenta de sangue do que antes.
Attila lidera o bando na direção leste, na direção dos apartamentos iluminados. Fita os terraços dos arranha-céus. Sabe como subir até eles, como entrar. Vai chegar lá sozinho e abrir as portas para os outros. O cheiro manda que faça isso. Desta vez, ele não vai vacilar.
Qualquer clemência que tenha sentido pelo homem não chega mais a ser nem uma lembrança. Pois ele não tem memória. Só tem aquele cheiro: seu mestre, amigo, companheiro. O cheiro é tudo.
(…)
Ah, com que rapidez a maré mudou… A maré vermelha como sangue.
†
Zoo já vendeu mais de quatro milhões de livros no mundo e a rede de televisão americana CBS adaptou o livro para uma série de TV, com direitos adquiridos pelo Netflix.
Para quem gosta de um bom suspense pincelado com algumas cenas mais fortes dos ataques, entregue-se com tudo a essa leitura. Vamos também aproveitar para repensarmos um pouco a forma como tratamos nosso já tão mal cuidado planeta.
site: http://blogeverythingbutthebooks.com/2015/10/17/resenha-zoo-de-james-patterson-e-michael-ledwidge-editora-arqueiro/