Ana Júlia Coelho 09/05/2022Carolina nos leva para dentro da extinta favela do Canindé, onde hoje localiza-se a Marginal do Tietê. Descrevendo sua rotina em um diário, Carolina entrega para o leitor um relato visceral do que é viver invisível para o poder público e o resto da sociedade.
Os relatos são dos anos de 1955, 1958 e 1959. Carolina, mãe solteira de três crianças, narra como faz para ganhar algum dinheiro (catadora de papel e outros materiais recicláveis). O pouco dinheiro que consegue com esse trabalho mal dá para alimentá-la e às três crianças. Muitas vezes, todos vão dormir com fome. O pouco que ganha mal cobre as despesas básicas, quiçá a compra de vestimentas ou calçados para enfrentar a rotina cansativa da favela, ou a manutenção de seu barraco, onde goteiras incomodam em dias de chuva. O pouco que ganha vira nada quando a chuva se faz presente e Carolina não consegue sair para catar papéis.
A vida na favela não é fácil. Quando sai pra trabalhar, Carolina se preocupa com os maus-tratos que seus filhos podem sofrer por parte dos vizinhos. Quando sai pra trabalhar, Carolina não sabe se conseguirá comprar comida no fim do dia, se terá uma noite com o estômago vazio e reclamações dos filhos. Quando sai pra trabalhar, Carolina se cansa só por saber que no dia seguinte precisará fazer tudo novamente, sem garantia de nada.
São relatados os problemas com a água disponível para os moradores. São relatadas as promessas de políticos que só aparecem em época de eleição. São relatados conflitos entre os moradores. Também é relatado algo muito atual, com o tanto de miséria que tem se espalhado no Brasil nos últimos anos: a ida a frigoríficos em busca de OSSO para fazer comida. A falta de dinheiro não permitia o consumo de carne com frequência, e os favelados contentavam-se em obter ossos que seriam jogados fora.
O livro foi bem difícil de ler. O organizador do diário preferiu manter a escrita original de Carolina, para passar mais veracidade ao que era relatado (muito erro de português e muitas palavras que eu nem ao menos consigo imaginar o que significam). A história em si é bem triste e desesperadora. Torna-se até repetitivo o tanto de relato de fome e miséria... o problema é que a fome e a miséria são repetitivas. É difícil relatar tudo que foi chocante de ler aqui nesse espacinho, só lendo para entender o quão difícil foi a vida de Carolina.
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