Gisele @abducaoliteraria 14/11/2017"A tecnologia humana era boa, mas a arma que importa, no fim das contas, é aquela que fica atrás do gatilho".Quando você gosta muito de um livro, fica difícil controlar as expectativas quanto à continuação. Guerra do Velho não foi só o responsável por iniciar a minha vibe sci-fi, mas também um dos livros mais divertidos que li em 2016.
Eis que a tão aguardada continuação chega ao Brasil e acabei me deparando com algumas críticas negativas, de pessoas que assim como eu, tinham adorado o primeiro livro.
Além do procedimento de controlar as expectativas, decidi me esquivar das demais opiniões e tentar apreciar a história do zero, sem ficar comparando com Guerra do Velho. O que não foi difícil, já que a história não apresenta uma continuação direta, mas uma trama independente e com um novo protagonista.
Devo dizer que a princípio me deparei com um início fantástico, o que dificultou um pouco para manter as expectativas controladas, mas felizmente, o nível da história não diminuiu e ela conseguiu me agradar muito.
Conforme o próprio nome do livro diz, nesta história passaremos a conhecer um pouquinho mais sobre As Brigadas Fantasma, que são formalmente intituladas como as Forças Especiais das FCD (Forças Coloniais de Defesa). Estes soldados são criados a partir do DNA dos mortos - pessoas que se alistaram, mas que morreram antes dos 75 anos - e são transformados em soldados aprimorados que são destinados às missões mais difíceis e fatais pelas FCD.
"Somos projetados para sermos mais fortes, rápidos e espertos que outros seres humanos. Mas somos assim como consequência do que nos torna diferentes. O que nos torna diferentes é que, entre os humanos, somos os únicos que nascem com um objetivo. E esse objetivo é simples: manter os seres humanos vivos neste universo".
Após a descoberta de uma conspiração contra a humanidade, envolvendo três raças e um humano traidor, a União Colonial - governo que opera fora da Terra, lida com alienígenas e organiza as colônias de humanos em outros planetas - segue para tentar descobrir que tipo de ameaça as raças representam à humanidade e as motivações que fizeram o humano trair a própria natureza. E mais do que isso, é preciso descobrir a importância das informações que o traidor revelou aos inimigos e o quanto a humanidade deve teme-los a partir daí.
O traidor em questão é Charles Boutin, um dos cientistas mais importante e inteligente da União Colonial. Ele é capaz de colocar toda a raça humana em risco através do seu amplo conhecimento.
Uma das possíveis formas de conseguir respostas, é através de Jared Dirac, criado a partir do DNA e consciência de Boutin, com o intuito de acessar as informações do cérebro do traidor e repassar as informações. A princípio, o plano dá errado, porque Jared Dirac nasce aparentando as características de um soldado comum, desprovido de conhecimento e lembrança. Ele então é resignado para As Brigadas Fantasma sob os cuidados da tenente Jane Sagan (lembram-se dela?) , como um novo soldado, mas com grandes probabilidade de assim como Boutin, se tornar um traidor.
Conforme previsto, aos poucos a consciência de Boutin emerge e deixa Jared confuso, com lembranças e sentimentos que não lhe pertencem, resultando em um conflito interior de intenções e motivações.
"- Lembre-se de quem você é – disse Cainen. - Lembre-se de que você não é ele. E lembre-se de que você sempre terá uma escolha".
Depois de finalizar a leitura, finalmente me permiti fazer comparações entre Guerra do Velho e As Brigadas Fantasma. Compreendo as frustrações de quem iniciou a leitura querendo algo no mesmo estilo do primeiro livro e acabou se deparando com uma história mais lenta, com mais conflitos cognitivos e interpessoais.
Em contrapartida, além de estarmos no mesmo universo, também contamos com a presença gratificante de alguns personagens da história anterior, como por exemplo, Jane Sagan - na qual a propósito, virei fã. O humor prazeroso continua presente, tanto em situações embaraçosas e extremamente cômicas, quanto equilibrando momentos de maior tensão.
Jared Dirac também é muito diferente de John Perry, e digo que adorei as características do novo protagonista. Em meio à uma atmosfera tensa de conspirações, traição e guerra, visualizamos a maior parte da história sob o ponto de vista de alguém que foi despejado dentro dessa situação, e com a inexperiência e ingenuidade de Jared, vamos evoluindo junto com ele no decorrer da história.
As Brigadas Fantasma apresenta momentos de tensão e ação - mesmo este não sendo o forte da história. A narrativa continua deliciosa, fluida e descontraída, com diálogos divertidos e cheios de sarcasmo.
"Imagine se toda espécie se batizasse com seu maior defeito? Poderíamos chamar nossa espécie de arrogância".
Uma curiosidade particular bem interessante foi que minha leitura anterior à esta foi Frankenstein de Mary Shelley, e em As Brigadas Fantasma temos bastante referências sobre esse livro. Há inclusive algumas discussões sobre ele entre as Forças Especiais, que se comparam à criatura criada por Victor. Ter lido o clássico antes fez toda a diferença para entender melhor esta parte do livro, além de dar um toque especial à leitura.
Algo que não aprovei muito e motivo por eu ter tirado meia estrela do livro, foi que em determinados momentos a história era paralisada para entrar alguma explicação sobre o universo ou as tecnologias. Não atrapalhou muito a narrativa, mas como sei que Scalzi é capaz de fazer melhor do que isso, foi algo que me desapontou um pouco.
O final foi muito mais do que satisfatório, um pouco agridoce, mas acho que Scalzi encontrou a melhor solução para o que estava acontecendo. A primeira coisa que pensei quando terminei a leitura, foi "eu preciso de mais Scalzi", e me arrependi instantaneamente de ter lido esse livro tão rápido.
Mesmo você podendo ler As Brigadas Fantasma sem ter lido Guerra do Velho, eu não recomendo, porque nesta continuação temos várias referências do que aconteceu no arco anterior, e se você sentir vontade de ler Guerra do Velho depois, não será a mesma coisa.
Recomendo essa série para todos que curtem sci-fi, ou que sentem vontade de se jogar neste gênero, mas não sabem por onde começar. O universo criado por Scalzi é incrível, abundante e muito divertido. ;)
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