Acervo do Leitor 02/02/2018
RESENHA – Eu, Christiane F., 13 Anos, Drogada, Prostituída…
Christiane F. é, ou deveria ser, um modelo de livro quase que obrigatório nas escolas e no aprendizado institucional que depreende ao estado cívico nacional. Deveria ter uma série, ou algo parecido, e neste mesmo formato do enredo(até mesmo, cansativo, em certas partes) para um melhor entendimento das mais variadas consequências que a droga(independente de qual seja) traz e retraz a aqueles que a outorgam. Para aqueles quem a defendem, e é claro: aos que usam.
“(…)Aí o médico-chefe me disse que, se eu não assinasse, ele pediria um internamento ex-ofício de seis meses. Senti que caíra numa cilada. Louca de angústia, percebi que me entregara indefesa nas mãos desses médicos idiotas. Eles podiam me dar qualquer diagnóstico: neurose grave, esquizofrenia ou sei lá o que mais. Não tínhamos mais nenhum direito quando éramos internados em um hospital de loucos. Aconteceria comigo o mesmo que acontecera com Boneca. O pior era que nem eu mesma sabia qual era o meu grau de loucura. Devia admitir que era neurótica. Minhas entrevistas com os conselheiros do centro antidroga ao menos me ensinaram que a toxicomania é uma neurose, um impulso obsessivo. Foi o que pude concluir quando pensei na coisa. Ter feito tantos tratamentos para recomeçar em seguida, sabendo perfeitamente que aquilo acabaria me matando. Tudo o que fazia minha mãe sofrer, a maneira como me comportava com os outros, é claro que não era normal. Devia estar muito destruída. E lá estava eu imaginando como fazer para impedir que os médicos e enfermeiras percebessem que estava louca para sempre. (…)”
O filme, e tampouco esta resenha, não estão aqui para abrir críticas ao uso recorrente de qualquer substância, dita alucinógena, e também não há direção de amenizar os seus fatos. Mas, da forma como o livro aborda o consumo, a exposição(física e mental) de quem utiliza tais meios para se “satisfazer”, é inegavelmente necessária a sua veiculação entre o meio jovem de sua participação(escolas, igrejas, por exemplo).
A estória conta o caminho percorrido por Christiane, até então, com pouco mais treze anos e a sua vida pré-adolescência nos meados de 1976, em Berlim, no auge da música trazida por David Bowie e tantos outros daquela época. Uma época de liberdade, ou de tentativa desta em manifestar-se por meios da arte, moda e novos modos de comportamento, aqui neste sentido, intitulado como “o novo”… Até então, com uma infância “normal”, comparada aos padrões da época para tal classe de trabalhadores(e à sua família), ela, Christiane, tinha acesso remoto aquilo que uma criança normal teria, escola, amigos, brincadeiras, peraltices e etc… E claro, como todo adolescente daquela época, teria acesso a diversos modos ao uso de diversas drogas. Como uma escada para o inferno(a princípio, para o “céu”), ela teve acesso ao uso, primeiramente, de bebidas, cigarros, proximidade à algumas drogas e, posteriormente ao uso de: maconha, anfetaminas, cocaína e por fim: a heroína(na época, não havia o “crack). A partir daí, do uso da heroína, a estória toma uma forma pesada e comprometida. Torna-se, o próprio ar, como uma nuvem densa e poluente. Uma versão e depois, aversão de si mesma, enquanto usuária e dependente de algo qual mudaria a sua vida para sempre. E os dias a seguir, tornam-se repetitivos. São iguais, esses dias, em tentativas de dispersão, em tentativas de uso menor, em tentativas de se salvar de alguém que apresentava-se diariamente diferente e, ao mesmo tempo igual, em contrapartida de suas necessidades, também iguais: de manter-se afastada da droga(heroína) e de manter-se lá, também: inserida. usando-a por uma “última vez”.. e amanhã, por mais “uma última”, e depois, e depois, e depois, e depois.
“(…)Kessi conhecia esses caras e me apresentou a eles. Isso me emocionou e achei genial poder me aproximar deles, graças a Kessi. No Centro de Jovens todo mundo os respeitava. E nós tínhamos até mesmo o direito de nos sentar perto deles. Na tarde seguinte, a turma trouxe um enorme cachimbo. Eu não sabia mesmo para quê. . . Kessi me explicou que eles fumavam maconha. Eu não sabia muito bem o que era aquilo. Somente que era uma droga, e absolutamente proibida. Eles acenderam a coisa e a fizeram circular. Cada um deu uma tragada. Até Kessi. Quando chegou a minha vez, recusei. (…)”
Falar das personagens não ajudaria muito com a exposição do livro, pois estas são exatamente iguais à todas aquelas pessoas que, comumente vemos nesses patamares de diversão entre jovens: há a amiga(Kessy), o namorado carismático(Detlef), a família com seus problemas, os demais amigos de “balada”, e etc.. Portanto, acredito que ao leitor, embora narrada de uma maneira excelente pelos autores, a estória de personagens secundárias não se fará de tanta importância, pois o principal aspecto aqui são os desvios e as todas tentativas de Christiane em afastar-se e entregar-se ao uso recorrente e cada vez mais contínuo, dessa substância.
Logo, por tratar abertamente desse tipo de assunto e com uma forma até mesmo, crua de exposição ao seu interesse(demonstrar o uso das drogas), este livro torna-se um “tapa na cara” de quem pretende defender o quesito de liberdade de uso de substâncias alucinógenas e pior: o de sua apologia geral. De suas manifestações a favor, por exemplo.
“(…)Piet saiu pela varanda (era o que eu fazia geralmente — vivíamos no andar térreo e isso era genial depois de ter vivido no décimo primeiro andar) e voltou com uma placa do tamanho de uma mão, dividida em pedaços de um grama cada um, uma dezena de marcos. Ele trouxe também um shilom (Pipa especial para fumar maconha. (N. da T.)), que é uma espécie de cano de madeira com uns vinte centímetros de comprimento. Primeiro colocou fumo para que não fumássemos até a madeira e depois encheu com uma mistura de fumo e maconha. Fumamos colocando a cabeça para trás e segurando o cano tão vertical quanto possível, para não deixar cair as cinzas. Olhei atentamente como eles faziam. Sabia que não podia mais recusar, agora que Piet e Charly tinham vindo à minha casa. Falei com um ar muito tranqüilo: “Fumarei um pouco de dope hoje”, como se já tivesse fumado aos montes. (…)”
SENTENÇA
O livro dispõe ao leitor uma maior profundidade conforme o ato comportamental de quem utiliza tudo o que têm, seja nivelado por meio material, físico ou mental, daquele que desce ao fundo do poço em decorrência de erros quais não são tão fáceis de retirar, após um certo tempo até, quase que impossíveis… É um livro obrigatório, principalmente, para todos aqueles que não tem acesso a esses tipos de informação(tão chocante e cruel), pois os deixam aos portões de um cenário infernal que lá, existiu. E que, infelizmente, agora, existe e sub-existe bem à frente de nossos olhos: neste caso: uma cracolândia qualquer… um bando de moleques fumando maconha ou outros por aí, sabe-se-lá(agora) o que estiverem “consumindo”.
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