Bianca 18/11/2019
Muito humano
Neste livro, apesar do título que sugere embate e dos autores viverem em posições tão opostas, encontramos opiniões que muito se complementam e pouco se contrapõem.
Apesar de Karnal e Padre Fábio terem horizontes de sentido muito distintos - incompatíveis até - eles convergem na percepção do drama humano perante o sentido da existência, e o livro orbita mais em torno deste drama do que das possíveis discussões teóricas acerca da existência ou inexistência de Deus.
A maior parte do livro traz tanto Padre Fábio quanto Leandro Karnal contando suas experiências pessoais de crença e descrença, bem com compartilhando seus vastos conhecimentos de cultura e religião. Eles, sem dúvida, entendem muito de gente. Ambos falam muito das dificuldades que perpassam o caminho humano, tanto dos que abraçam a fé cristã quanto dos que seguem o caminho do ateísmo. Caso o leitor esteja esperando tentativas diretas de convencimento ou até mesmo provocações mais agressivas, tão comuns em nossa era de redes sociais, pode sair frustrado. No entanto, mesmo com a paz e o respeito mútuo bem estabelecidos, a leitura pode ser incômoda, principalmente para o leitor que está em posição contrária à exposta por um dos autores.
Padre Fábio, em especial, esforça-se em mostrar a fé como algo razoável e também parte indissociável da experiência humana. Ele, ainda, aproveita para apontar os comportamentos que considera falhos ou infantis naqueles que compartilham de sua fé. Imperfeitos que somos, temos muita facilidade de cair nos mais diversos erros e comportamentos equivocados com relação à fé, como a hipocrisia, o amargor, a falta de reflexão e de união entre os ritos e a mentalidade do fiel.
Muitas das frases são marcantes e trazem um conhecimento teológico profundo, muito distante da maioria dos leigos como eu. Com certa frequência, recordo de algo que aprendi neste livro em meu cotidiano.
Algo que fica claro é a importância da formação intelectual. A compreensão racional e cultural não é de forma alguma contrária à vida espiritual, mas pelo contrário, a fortifica e contribui para a evolução e o amadurecimento da fé.
Fica evidente, também, que a crença ou a descrença não são resultados do alcance de conhecimentos acerca do mundo nem de argumentos que possam convencer num debate. As pessoas crêem ou descrêem antes, e então interpretam a vida à luz da fé, ou da ausência dela. O que para o crente é o sobrenatural no dia a dia, para o descrente é parte da experiência humana, que mesmo que ele não saiba explicar, ele pensa não poder ser sobrenatural.
Este é um livro com potencial para ser livro de cabeceira, pra revisitar de tempos em tempos, confirmando ou desafiando a própria crença ou descrença, relendo os próprios bons e maus hábitos. Ver meus medos e desconfortos como algo comum à humanidade torna-os menores e mais fáceis de enfrentar. A jornada se torna não só mais leve, mas também mais bela.