luamagnetica 03/04/2021Um livro um pouco desconecto em sua linha do tempo mas muito realista quanto a maneira que os traumas de infância te seguem na vida adulta, com pequenos flashbacks e gatilhos de momentos e sentimentos tão específicos que eu achava que só eu havia sentido antes. Édouard Louis consegue com excelência trazer uma obra que representa bem como é carregar traumas da sua infância constantemente flutuando em sua mente. Das muitas formas que alguém pode experienciar a violência desde criança, vinda dos pais, dos colegas da escola ou de estranhos na rua e como é revoltante como esses momentos são memórias de curto-prazo para o violentador mas são um filme em constante replay na memória da vítima. Esse livro me trouxe, a cada página, lágrimas e memórias da minha própria biografia e em muitos momentos me deixou tão angustiada a ponto de não conseguir respirar até o capítulo terminar.
Eddy vive em um vilarejo conservador onde a masculinidade, alcoolismo, misoginia e heteronormatividade é culturalmente vangloriado aos extremos e desde criança, com seus trejeitos afeminados, recebia olhares e comentários desagradáveis apenas por - existir errado -
E com toda negligência e ignorância diante de sua homossexualidade velada teve suas primeiras relações (sexuais ou não) com homens e mulheres de maneira pertubadora o que, infelizmente, é a realidade de muitas pessoas LGBTQI+. Em um desses relatos das experiências ele diz algo que considero destaque do livro: "Brincar de homossexual era uma maneira que eles tinham de mostrar que não o eram. Era preciso não ser bicha para poder brincar que era, por uma noite, sem ser xingado"
Obras autobiográficas como essa que mostram como a homofobia e a violência atingem uma vítima são de extrema importância para pessoas que se colocam em cima do muro na luta, cruzam os braços e aceitam que o mundo seja como é. Dos olhares e comentários mais discretos diante dos trejeitos afeminados de Eddy até a violencia verbal mais direta e a violência física mais dolorosa, todos foram responsáveis por fazer uma criança constantemente odiar sua própria existência e viver em torno de mudar sua essência, sua natureza.
Também é uma bela obra àqueles que não conseguem entender pessoas que não são apegadas ou nem mesmo sentem amor pela sua familia. Quando a sua casa é cheia de violência, racismo e rejeição à tudo que você é não dá para sentir amor pelas pessoas apenas por dividirem o mesmo sangue.
Recomendo muito mas aviso que tem muitas partes de revirar o estômago, cuidado com os gatilhos!