Ricardo Rocha 03/12/2010
deuses não mais existem e o Cristo ainda não ” – nessa frase marguerite irá se deter e nesse período gastar boa parte da vida e depois de diversos manuscritos destruídos descobre o tom de seu livro. se dizia jovem demais quando começou mas agora está pronta e a literatura recebe uma de suas obras mais importantes. não bastasse, recusou o goncourt que na frança é o equivalente a recusar o nobel. é coisa linda quando autor e obra se equivalem, quando não é a obra prima de um vaidoso (pra dizer o mínimo) nem o livro mediocre de um homem bom.
um homem entre o ascetismo e o prazer de repente diante de algo cuja aceitação não lhe trará prazer algum ou talvez algum, é o que ela passou tanto tempo à procura - vozes, a da humanidade inteira ou apenas a voz dele, homem imenso porque único, mas ainda homem e por isso muito pequeno. desses paradoxos Adriano se constrói.
o corpo de um homem que avançando em idade se prepara para morrer - o que faz sentido e não faz, essa coisa de idade, porque toda idade tem um corpo e se o corpo funciona, toda idade é qualquer idade, não há diferença - ah, é isso, ó tu guardião da pequena alma terna e inconstante, companheira com que descerá aos lugares onde só ali renunciará aos jogos e só ali dirá "jogos de outrora"
sim: a biografia de um escritor são seus livros
Trecho
“Esta manhã, pela primeira vez, ocorreu-me a idéia de que meu corpo, este fiel companheiro, este amigo mais fiel e mais meu conhecido do que minha própria alma, não é senão um monstro sorrateiro que acabará por devorar seu próprio dono. paz... Amo meu corpo. ele me serviu muito e de muitas maneiras: não lhe regatearei agora os cuidados necessários. mas já não creio — como Hermógenes pretende ainda — nas maravilhosas virtudes das plantas, na dosagem exata dos sais minerais que ele foi buscar no oriente. esse homem, embora perspicaz, cumulou-me de vagas expressões de conforto, demasiado banais para iludir a quem quer que seja.”