spoiler visualizarXanda 26/05/2021
RISÍVEL
QUE LIVRO COMÉDIA. Quando queria ser engraçado falhava e quando tentava desenvolver o plot era HILÁRIO. O desenvolvimento do enredo é péssimo, risível, fanfiqueiro, desconexo, absurdo mesmo. Tem vários momentos dessa história toda que não fazem o menor sentido lógico, parece que foi alguém com 14 anos quem escreveu. A autora introduziu comédia demais, voluntária e involuntariamente, e simplesmente não tem como levar a história a sério como New Adult.
A verdade é que esse livro é extremamente infantil, se tirar a única cena de sexo que tem nele a faixa etária automaticamente cai pra 14 anos. As piadas, que deveriam ser para alívio cômico no enredo, visto que o gênero literário não tinha por foco ser majoritariamente comédia, são uma constante na história e sua qualidade é sempre duvidosa (repetitiva, tosca, deselegante, bobinha - falando de peido, bunda e peito...). A dinâmica social é bizarra, parece visão de criança sobre o mundo, juro que esse é o nível de desenvolvimento da autora sobre os eventos do enredo e as ações dos personagens. Eles tomam decisões radicais e extravagantes sem princípio lógico ou prático nenhum, executam em segundos e quando tentem justificar é uma tosqueira sem fim, muito forçada, sem sentido, parece fanfic mesmo: rápido, dramático e extremo.
Eu cheguei nesse livro porque a sinopse parece tudo de bom: caçador de bruxas e bruxa em segredo são forçados a se casar e viver um enemies to lovers. Tudo pra ser maravilhoso, não fosse pelo desenvolvimento e caracterização péssimos. Primeira coisa, que não é um problema geral, mas pessoal, é que não me contaram que o caçador de bruxas era crente e virgemzão, que toda vez que ele estava estressado eu tinha que aturar ele lendo a Bíblia no POV dele quando ele tentava achar inspiração divina (aqui eu sou bem sem paciência para com o cristianismo, não é para mim). O problema mais gritante mesmo é que o romance tem uma evolução forçadissima, super rápida, com direito a muita coisa problemática, visto que o Reid é insuportável e muito tóxico (discurso de honra masculina, ciumento, possessivo, controlador, territorial, tendência agressiva) e honestamente eu cheguei no final e não vi o crescimento dele, continuou do mesmo jeito enquanto a autora me forçava goela abaixo que não.
Na minha visão isso aqui foi uma romantização do casamento católico tradicional (???) A quantidade de vezes que eles argumentam que fizeram uma promessa de se amarem e se cuidarem perante Deus e agora tem que ficar juntos para sempre e tem obrigação de fazer dar certo não importa o que.... Sério, é o tempo todo isso. Eles tem uma obsessão em fazer o casamento dar certo e ter amor nele praticamente sem um motivo aparente. TODAS eu disse TODAS as vezes que o Reid demonstrou o mínimo de afeto pela Lou foi na verdade marcação de território. Qualquer carinho físico só acontecia quando alguma outra pessoa chegava perto dela para reforçar a presença dele, etc. Lou: carente. Combinação incrível. E dai no livro isso é bom??? Isso é equilibrado, saudável e aceitável? Romance modelo? Homem possessivo (e de fato ele usa muito "minha" na narrativa dele) e mulher carente, cheia de traumas, querendo homem para passar a mão no cabelo dela? Se is/so vai ser vendido como algo bom e não como algo PODRE, sem condições.
O que tem de melhor no livro provavelmente é a Lou e mesmo assim deixa a desejar desenvolvimento e criatividade. Ela é carismática no sentido de que ela é uma mulher personagem principal, mas com a personalidade daquele personagem coadjuvante homem bem típico que é inserido como alívio cômico da história por ser vulgar, engraçado, namoradeiro, impulsivo, meio machista e nojento, que cospe no chão. Mas novamente, podia ser uma personagem dentro da série Percy Jackson. Extremamente infantil e autocentrada. Moralidade beirando a zero. Além disso, a Lou está na minha lista de personagens femininas que foram criadas e promovidas como revolução feminista, quebra de padrões, etc QUE DEFINITIVAMENTE NÃO SÃO COMO AS OUTRAS GAROTAS E AMAM REAFIRMAR ISSO mas que no final do enredo sua resolução de personagem está em conseguir um final feliz e padrão, que é por mera coincidência o sonho das "outras garotas". O desenvolvimento da personagem é bem medíocre e superficial (o mesmo vale pros outros personagens), a exemplo de que ela falou VÁRIAS vezes que jamais se imaginava casada, mas bem rapidinho aceitou essa vida com o Reid, um homem que honestamente não mudou NADA do comportamento tóxico que fazia a Lou odiar ele no começo do livro. Não entendi qual era para ser a lição. Homem usa pronome correto com sua esposa e demonstra o mínimo de respeito por ela e mulher aplaude a "evolução", curte a vida de casada cujo novo desejo de possuir não foi desenvolvido em momento algum e ignora que o marido continuou tóxico?
Os coadjuvantes tem os mesmos problemas. Basicamente, a autora tinha um monte de personagens na cabeça dela e na hora de decidir quais ela ia meter de qualquer jeito no livro ela adotava um filtro onde a resposta para todas as seguintes perguntas tinha de ser sim: Esse personagem sente ciúmes e inveja fácil? É burro(a) a ponto de não perceber o que está na cara? Quebraria algo ou agrediria alguém em momentos de raiva? Acredita em algum Deus? É hipócrita e inconstante? Então pode entrar.
De tudo, o que mais me incomodou foi a verossimilhança que passou longe desse livro. Que universo terrivelmente mal desenvolvido, de sentar e decidir se dá risada ou se chora. Vamos lá, eu entendi que se passa num universo paralelo da França medieval, com magia. Como faltou muito desenvolvimento dos padrões dessa sociedade, imagina-se que seria próxima da referência, logo me incomodou demais a linguagem informal dos personagens e a maneira descontraída que interagem, também as gírias que usam e os conceitos, ideias e valores que abordam. É preguiço me largar um "para de ser machista" bem direto, durante um dialogo, numa história que se passa na França medieval. O comportamento dos personagens parece muito deslocado do cenário. A autora quis reforçar muito que a atmosfera era francesa usando os piores nomes e referenciais possíveis, bem bregas e forçados. O padeiro Pan foi a cereja do bolo. Recentemente, terminei de ler Bone Crier's Moon que também é um enemies to lovers situado num universo mágico inspirado na França. A série é juvenil. De alguma maneira conseguiu ser muito mais adulta que Serpent & Dove e ter cenários, referências e nomenclaturas mais complexas, além de uma construção de universo que não tornasse o comportamento dos personagens mais próximo de nós no século XXI em uma coisa desconexa no enredo do livro.
Acontecem muitas cenas sem sentido nenhum, portanto completamente risíveis (em momentos que deveriam ser sérios). Se alguém que amou esse livro estiver lendo a minha resenha, pode me responder por favor se vê lógica na cena que ela CORTA o braço e respinga no lençol (inclusive de acordo com o Reid, o espectador) MUITO SANGUE MESMO, a ponto de sujar o chão, as roupas dela, etc para comprovar que transaram? AMIGA numa escala prática e realista de como ficaria o lençol, o dedo tava mais que bom. Dai eles fazem isso pra não levantar suspeitas, mas tem que queimar as roupas e as outras coisas sujas de sangue, fazer curativo nela, pedir outra roupa... E nada disso não era suspeito??? Tem várias cenas assim, bizarras de ilógicas (convencer guarda a deixar a prisioneira sair, o próprio casamento forçado como se não houvesse vinte outras soluções possíveis, reencenar eventos, descobertas de maternidade e paternidade mal justificadas, final bizarro, etc) mas não vou me estender mais nesse monstro de resenha com isso. Penso que não seja possível que a autora queria ser levada a sério, penso que ela queria que fosse engraçado, mas o pior de tudo é que não era para ser piada.
Além disso tudo, tem várias outras falhas e pontos negativos, resumidamente: representatividade forçada; personagens esquecidos e abandonados; vitimas vilanizadas; universo de fantasia não desenvolvido; regras da magia não explicadas além de que deixaria um rastro/cheiro; criaturas mágicas que são mencionadas, mas logo esquecidas, não servem para nada, nem chegam a lugar nenhum (como os lutins); comentários genéricos demais sobre temas sérios como depressão, religião, uso de drogas; distribuição dos eventos muito mal cronometrada; e uma narrativa que eu também achei muito pobre. Os diálogos são forçados, preguiçosos, nada é apresentado de forma sutil, tem metáforas super estranhas e novamente uma verossimilhança problemática e atemporalidade deslocada.
E vamos falar agora das "inspirações" extraídas da Wicca. Para mim, não foi uma inspiração (algo que se baseou em algo e foi transformado em algo novo) mas sim uma referência direta (era a própria Wicca ali), embora não acho que fosse a intenção da autora. E porque foi problemático? porque foi extremamente mal representado e distorcido. A Wicca é uma religião como qualquer outra, o mínimo de licença e cuidado ao sair usando esses símbolos era necessário. Comparar deusa tríplice e sagrada família/trindade divina? Desnecessário. Desserviço para os dois lados. É bem contraditório falar que esse livro tem algo a ver com bruxaria, visto que a autora claramente tem zero noção sobre o assunto.
Assim como também seria forçado dizer que o livro foi feminista, visto que a competição feminina tóxica (e por homem) é forte (com direito as rivais se chamando de "vaca" e "vadia"), os rótulos e padrões dos mais esdrúxulos são reforçados, mulheres são reduzidas a objetos e criticadas/culpabilizadas por isso, personagens femininas são desleais e competitivas entre si, reforçam piadas machistas ou sobre corpo, etc. A ex namorada do Reid não serve para nada na história além de ser a ex dele. E lembrando também que a própria Lou fala algo do tipo "existe matar e assassinar e nós bruxas pedimos mesmo para morrer da pior forma, a gente PEDE" querida (?)
Ai, sério, que bruxas são essas que entregam umas as outras pra queimar? Ainda sobre feminismo nesse livro, é ótima a decisão de que se aborde esse tema, mas por favor né... Não atinge o mínimo de profundidade, é contraditório na boca de certos personagens e a maneira como se apresenta foge total do contexto do universo. Se vai ser clichê (mulher vestida de homem) e desserviço (mulheres se colocando contra mulheres ao invés de ajudar mulheres) que nem tenha, então.
Enfim, que viagem... não recomendo. Ruim mesmo.
Dito isso, eu li a continuação. As vezes a gente só precisa de alguma coisa leve, fácil e ridícula para se distrair né. Não era a intenção da autora que o livro dela fosse cômico nesse sentido, mas as vezes a gente tem que encarar a realidade, fazer o quê.
Spoiler da continuação: Fica pior. Morreu o pouco de enredo que tinha.
Gatilhos: frases que ocasionalmente soam transfóbicas, macho quebrando coisas durante brigas e se comunicando constantemente de forma agressiva, figuras religiosas falando que pode bater em mulher se forem casados, uma definição errada e bizarra sobre pessoas assexuais que eu não sei como passou na edição, romantização de relação de poder, adulto passando cantada em menor de idade, agressão familiar, abandono maternal/paternal, enfim, só piora...