Alessandro232 01/11/2020
Um livro sobre o "deserto" que todos nós carregamos
TAG- EXPERIÊNCIAS LITERÁRIAS
"O Deserto dos Tártaros" é um livro aparentemente simples e curto. Mas, não se engane com sua aparentemente "simplicidade". Sem determinar a localização geográfica, acompanhamos a trajetória do protagonista, o jovem militar Giovani Drogo em direção a um lugar chamado "forte Bastiani". No entanto, somos informados pelo narrador onisciente, que ninguém sabe onde fica esse local, e Drogo, assim como o leitor se sente perdido, sem saber se ele existe ou não.
A sensação de decepção do protagonista,- que é transferida ao leitor- diante desse cenário que revela ser desolador e hostil. No entanto, passado algum tempo, Drogo sente que quando está no forte Bastiani há alguma coisa que o impulsiona a permanecer ali, como se algo grandioso no futuro ocorresse e pudesse lhe trazer algum tipo de recompensa pelo período em que ficar lá. Assim, Buzatti começa a narrar situações aparentemente banais, mas, que gradativamente revelam uma conotação filosófica sobre o que vem a ser a passagem muitas vezes morosa e entediante do tempo.
Buzatti que também era pintor, faz belas descrições pictórias do Forte Bastiani, que em alguns trechos revela contornos sobrenaturais, assim como a paisagem árida formada por montanhas que fica em seu entorno. Há nisso um elemento que dá uma conotação fantástica ao romance, e confere a obra um toque de originalidade.
Não é um livro de lances que podem ser considerados "emocionantes", e, embora concentrado na rígida rotina militar de Drogo e os habitantes do Forte, o autor cria uma contínua atmosfera de suspense em torno da provável invasão do povo tártaro. Será que isso realmente vai acontecer? Só lendo o livro para saber.
No desfecho da jornada de Drogo, nós leitores, ficamos com a impressão que todos nós carregamos dentro de si uma espécie de "deserto dos tártaros". O livro nos ensina que cada um tem o seu, e, por isso, temos que aprender a conviver com ele.
Para mim a leitura foi bastante fluída e a obra me fez refletir sobre aspectos- alguns negativos- da minha vida. A escrita de Buzatti em muito trechos é bastante poética, com matizes insólitas que torna seus cenários fascinantes e misteriosos destacando-se entre eles o imponente Forte Bastiani. Além disso, o final é surpreendente, imprevisível e de grande beleza, um dos mais bonitos e pungentes da literatura universal.
"O deserto dos tártaros" para mim foi uma experiência literária bastante prazerosa. Ele é outro pequeno livro no tamanho, mas imenso no conteúdo que traz interessantes questões filosóficas. O romance foi meu primeiro contato com a prosa em algumas passagens poética de Buzatti. Não é a toa que a obra é um dos clássicos da literatura italiana e um dos livros favoritos de Antônio Candido, o maior crítico literário brasileiro, que tem o trecho de sua resenha publicado na revista. - ela pode ser lida na íntegra no site da TAG.
Leitura altamente recomendada para quem quer ler algo diferente que nos refletir sobre o mistério "o que é vida" e cuja resposta pode ser surpreendente como aquela proposta na obra-prima de Dino Buzatti.