Ivy (De repente, no último livro) 14/03/2020
Resenha do blog "De repente no último livro..."
Eu tenho uma dificuldade imensa com livros inteiramente ambientados em florestas, ou selvas, ou pântanos. Com o passar das páginas, meu interesse vai minguando e os acontecimentos se tornam cansativos e repetitivos pra mim. Apesar de A filha do rei do pântano ser um livro curtinho, não deu pra escapar da monotonia da metade do livro, quando parecia que tudo se resumia às lembranças de Helena sobre seu pai psicopata vivendo isolada na cabana no pântano, sem contato com nada do mundo exterior.
Helena é uma boa narradora, acho que sua voz e ponto de vista conseguem deixar transparecer realismo e emoção à narrativa, mas ainda assim senti que faltou algo. Mais ação, mais reviravoltas. Achei este um suspense de ritmo lento, os personagens quase não evoluem e até Helena tomar as rédeas da situação e reagir, se passa muitas páginas com a garota apenas caçando e vivendo uma realidade quase de primata.
Não é um livro ruim, na verdade, é um suspense denso e complicado de se escrever pois descreve não apenas a vida em isolamento completo, mas a vida na natureza selvagem, tendo de subsistir com pouco ou quase nada. Dá pra notar o trabalho de pesquisa e a dedicação da autora colocados na caracterização da estória toda, no complicado que é criar esse ambiente inóspito e peculiar.
No entanto, achei a trama desinteressante. Helena não é um personagem simpático. Ela é durona e esquisita, complicada de traçar um perfil confiável. Seu pai, o grande vilão, é de botar medo porque ele é um típico criminoso perverso e narcisista, carregado de frieza, e suas características ficam bem marcantes na trama, ainda assim, embora seja um bom vilão, não consegue fazer a estória se tornar marcante. E quanto à mãe, a vítima sequestrada ainda na adolescência, acho que ela desempenha bem seu papel, expondo ao leitor toda a fragilidade de alguém submetido à brutalidade e opressão durante anos à fio, mas também ficou a sensação de que se sabe quase nada sobre sua real personalidade, seus anseios e suas dores.
Apesar de ter tido detalhes que me cansaram, não dá pra deixar de elogiar os pontos que tornam a leitura interessante. Além da ambientação diferente e sombria, isolada e apavorante, temos alguns fatos que tornam a trama bem tensa. Tem fatos que a gente consegue prever o que vai acontecer e dá vontade de gritar, avisar Helena pra não fazer isso ou aquilo, e é arrepiante acompanhar e ver o resultado certeiro de suas más escolhas. Essa aflição que certos momentos do livro despertam no leitor é incrível em livros de suspense e torna a trama mais palpável pra nós, a gente meio que vivencia tudo aquilo através dos olhos de sua narradora.
O livro melhora consideravelmente da metade para o final. Helena sai do seu deslumbramento e se questiona mais, enxerga o pai com um olhar mais crítico. E quando a casca ao redor dela começa a se abrir, ela começa a reagir.
Embora dê a entender que a trama se foca na fuga do Rei do Pântano e na caçada de Helena para encontrá-lo, a verdade é que a maior parte da trama busca explicar a infância da personagem, como tudo se tornou o que é, então temos pouco do tempo presente, e mais do passado. Essa alternância entre passado e presente ajudam o leitor a entender bastante coisa.
Acredito que todas as pontas soltas são finalizadas nos capítulos finais, mas o desfecho principal ficou um pouco corrido. Durante toda narrativa conhecemos um vilão cruel e inteligente, perspicaz, mas no final tudo se resolve rápido e de maneira bem simples. É aquele tipo de final linear, sem surpresas, dentro do esperado. Achei que poderia ter sido um desfecho um pouco mais denso.
A escrita da Karen Dionne é boa. Como disse, ela desenvolve a estória dentro de uma ambientação limitada e isso é bem difícil. Faltou algo sim na trama toda no geral, mas não dá pra tirar o mérito da autora, que consegue criar personagens atípicos dentro de um cenário que exigiu muita veracidade. Acho que Dionne ainda pode surpreender os leitores em seus próximos livros.
Esse livro me lembrou bastante de "Nossos dias infinitos" da Claire Fuller. A instabilidade dos narradores de ambos os livros aliado ao cenário desolador fazem ambas as tramas serem bem semelhantes, por isso mesmo acredito que quem gostou de um, vai gostar bastante do outro.
No geral, A filha do rei do pântano é um bom livro. Curtinho, rápido e diferentão, pode conquistar quem aprecia livros mais cheios de detalhes, com personagens duvidosos. Faltaram algumas coisas ao livro, talvez mais reviravoltas, questionamentos e surpresas, ainda assim, pra mim foi um suspense que conseguiu trazer aquela sensação de incômodo necessária, que nos ficar pensando na trama mesmo após já ter terminado suas últimas páginas.
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