spoiler visualizarAdriano 12/06/2021
O tamanho do buraco que colocaram o Brasil
Trechos
6.
O Ur-Fascismo provém da frustração individual ou social. O que explica por que uma das características típicas dos fascismos históricos tem sido o apelo às classes médias frustradas, desvalorizadas por alguma crise econômica ou humilhação política, assustadas pela pressão dos grupos sociais subalternos. Em nosso tempo, em que os velhos ?proletários? estão se transformando em pequena burguesia (e o lumpesinato autoexclui-se da cena política), o fascismo encontrará nessa nova maioria o seu auditório.
necessidade e merecem um ?dominador?. No momento em que o grupo é organizado hierarquicamente (segundo um modelo militar), qualquer líder subordinado despreza seus subalternos e cada um deles despreza por sua vez os seus subordinados. Tudo isso reforça o sentido de elitismo de massa.
11.
Nesta perspectiva, cada um é educado para tornar-se um herói. Em qualquer mitologia o ?herói? é um ser excepcional, mas na ideologia Ur-Fascista o heroísmo é a norma. Este culto do heroísmo é estreitamente ligado ao culto da morte: não é por acaso que o mote dos falangistas era: ?Viva la muerte!? À gente normal diz-se que a morte é desagradável, mas é preciso enfrentá-la com dignidade; aos crentes diz-se que é um modo doloroso de atingir a felicidade sobrenatural. O herói Ur-Fascista, ao contrário, aspira à morte, anunciada como a melhor recompensa para uma vida heroica. O herói Ur-Fascista espera impacientemente pela morte. Em sua impaciência, é preciso ressaltar, consegue na maior parte das vezes levar os outros à morte.
12.
Como tanto a guerra permanente quanto o heroísmo são jogos difíceis de jogar, o Ur-Fascista transfere sua vontade de poder para questões sexuais. Esta é a origem do machismo (que implica desdém pelas mulheres e uma condenação intolerante de hábitos sexuais não-conformistas, da castidade à homossexualidade). Como o sexo também é um jogo difícil de jogar, o herói Ur-Fascista joga com as armas, que são seu Ersatz fálico: seus jogos de guerra são devidos a uma invidia penis permanente.
13.
O Ur-Fascismo baseia-se em um ?populismo qualitativo?. Em uma democracia, os cidadãos gozam de direitos individuais, mas o conjunto de cidadãos só é dotado de impacto político do ponto de vista quantitativo (as decisões da maioria são acatadas).
Para o Ur-Fascismo os indivíduos enquanto indivíduos não têm direitos e ?o povo? é concebido como uma qualidade, uma entidade monolítica que exprime ?a vontade comum?. Como nenhuma quantidade de seres humanos pode ter uma vontade comum, o líder apresenta-se como seu intérprete. Tendo perdido seu poder de delegar, os cidadãos não agem, são chamados apenas pars pro toto, para assumir o papel de povo. O povo é, assim, apenas uma ficção teatral. Para ter um bom exemplo de populismo qualitativo, não precisamos mais da Piazza Venezia ou do estádio de Nuremberg. Em nosso futuro desenha-se um populismo qualitativo TV ou Internet, no qual a resposta emocional de um grupo selecionado de cidadãos pode ser apresentada e aceita como a ?voz do povo?. Em virtude de seu populismo qualitativo, o Ur-Fascismo deve opor-se ao ?pútridos? governos parlamentares.
14.
O Ur-Fascismo fala a ?neolíngua?. A ?neolíngua? foi inventada por Orwell em 1984, como língua oficial do Ingsoc, o Socialismo Inglês, mas certos elementos de Ur-Fascismo são comuns a diversas formas de ditadura. Todos os textos escolásticos nazistas ou fascistas baseavam-se em um léxico pobre e em uma sintaxe elementar, com o fim de limitar os instrumentos para um raciocínio complexo e crítico. Devemos, porém, estar prontos a identificar outras formas de neolíngua, mesmo quando tomam a forma inocente de um talk-show popular.