Thabata 28/11/2019Esse livro esta gravado no meu coração Nunca gostei muito dos filmes e da adaptação da Disney. Não tinha nenhum motivo pra não gostar, simplesmente não gostava, assim, gratuitamente. Mas depois de ler a versão original de A bela e a fera e de Aladim, que me decepcionaram um pouco, e talvez porque Peter Pan esta sendo muito falado na novela, acabei ficando curiosa sobre como seria a estória contata através do livro. E que grata surpresa eu tive.
A narrativa é feita por um narrador onisciente e onipresente, que o tempo todo fala com o leitor e adianta ou retroage a narrativa, criando um jeito todo peculiar de contar os fatos. Como se não bastasse, ele ainda muda constantemente de assunto no meio de outro, exigindo mais da nossa atenção na hora da leitura. Essa forma exótica de contar, acabou sendo uma experiência bem gostosa e estranha pra mim.
Outra coisa que me encantou foi a diversidade de formas que você pode enxergar a estória. Ela não é um romance infantil, como as adaptações fazem parecer. Peter é uma personagem bastante complexo e cheio de dualidades e contradições. Ao mesmo tempo que se recusa a crescer, assume o comando e responsabilidade de cuidar dos meninos perdidos, fazendo de conta que é pai deles e a Wendy sua mãe; gosta de contos de fadas e é inocente ao ponto de desconhecer o que é um beijo, contudo trava sérias lutas de espadas com um adulto ; tem uma memória péssima e não guarda nenhum acontecimento ou pessoa em sua mente por muito tempo (o que pra ele pode ser bom, pois não tem mágoas, mas o faz parecer extremamente egoísta em vários momentos, já que parece não se afeiçoar verdadeiramente a ninguém); é orgulhoso ao extremo e muitas vezes chega quase a se tornar um tirano, cheio de regras e proibições criadas apenas para que ele não se sinta mal ou inferior (como proibir que os meninos falem de mães ou que aprendam a ler).
Apesar de não querer falar de mãe, Peter leva Wendy para a terra do nunca para que ela assuma esse papel e cuide dele e dos meninos perdidos. O seu papel na trama se resume basicamente em cuidar da casa e dos meninos, contar estórias, costurar roupas e nunca questionar as decisões do chefe da família (o que fica bem explicito num ponto da narrativa). Isso chega e ser bastante incomodo, mas faz a gente pensar na visão da época do papel de mãe na família.
Outro ponto que chamou bastante minha atenção foi a necessidade que todos tinham de "fazer de conta" que tinham determinadas refeições durante o(s) dia(s) e que tomavam algum tipo de remédio. Isso faz a gente se questionar até que ponto a terra do nunca é um lugar tão fantástico quanto se pinta. Quando você precisa fingir que se alimenta ou que cuida da saúde, que são necessidades básicas, é sinal claro de que as coisas não estão tão bem.
Achei o final bastante nostálgico e um tanto perturbador: Peter volta e encontra a Wendy grande, mas leva sua pra terra do nunca em seu lugar, pra que a menina cumpra o que foi prometido pra ele e esse acontecimento se perpetua ao longo das gerações com a neta da Wendy, com sua bisneta e assim por diante. Ou seja, o Peter toma o papel de um espirito que aparece de tempos em tempos e leva a filha da família (fica claro que precisa ser uma menina) para um lugar distante, retornando com ela um tempo depois, sempre repetindo o comportamento ao longo dos anos e das gerações. Esse final me deixou com a pulga atrás da orelha, se o Peter e a terra do nunca não teriam outro significado além do de uma experiência fantástica vivida por todas as crianças em determinado momento de suas vidas.
Eu super recomendo essa leitura. Pretendo lê-la novamente daqui um tempo. Como eu disse, é uma daquelas estórias que você precisa ler com cuidado e mais de uma vez, pra poder enxergar coisas que você não viu antes e ver com outro entendimento aquilo que você estava cheio de certezas que tinha visto bem.