Flávia Menezes 09/01/2023
??? O ALGORITMO DA AMIZADE.
?Devoradores de Estrelas?, esse thriller científico escrito pelo autor americano, e best-seller por ?Perdidos em Marte?, Andy Weir, foi publicado em maio de 2021 com uma adaptação para filme com previsão de estreia ainda para esse ano de 2023, muito embora não haja nenhuma informação oficial mais atualizada sobre esse assunto.
Essa foi a minha primeira experiência com o gênero Sci-Fi, e a indicação veio de quem me conhece bem o bastante, inclusive para poder me orientar de que seria muito melhor começar com esse enredo mais suave, e que tem um dos personagens mais amados por todos aqueles que já leram essa história, antes de me aventurar mais nesse tipo de literatura. Orientações sábias que me deixaram bastante confiante (e muito ansiosa!) para iniciar essa leitura o quanto antes.
Como eu já disse uma vez por aqui, em uma outra resenha, ler o livro preferido de alguém de quem gostamos, é uma forma de poder conhecê-la ainda melhor, olhando o mundo através dos seus olhos, e nos permitindo igualmente sermos tanto atraídos quanto encantados por tudo aquilo que tanto a fascina. E essa foi a forma como busquei mergulhar nessa leitura, desde a primeira página.
Porém, conforme as páginas iam avançando, eu não conseguia encontrar nenhum tipo de conexão com a história. A trama não me prendia, os personagens não me encantavam, e os diálogos não me traziam nenhum tipo de insight, ou uma mensagem que me deixasse surpresa ou fascinada. E assim foi do início ao fim, e quando eu encerrei o livro, tudo o que eu consegui sentir foi esse mix de alívio e frustração. Mas como para mim não basta dar a minha opinião de "esse não foi para mim", eu resolvi procurar pelo Fábio, e primeiramente compreender o que tanto havia lhe encantado com essa história.
Conforme ele ia relatando tudo o que tinha visto de interessante (e até genial) na escrita do Andy, eu percebia que esses eram os mesmos pontos que não havia me encantado em nada, e ao final, eu acabei expondo as minhas dificuldades nessa leitura. O que ele me falou a seguir, foi bastante certeiro e muito significativo para mim, quando ele me faz perceber que eu sou uma leitora que busca por uma conexão profunda com os personagens, mas que isso eu só encontraria com autores que possuem foco no desenvolvimento psicológico de seus personagens. E que quando eu me aventuro em histórias em que o autor é mais voltado para o enredo, minha mente se desconecta, e eu perco completamente o interesse. Quero até aproveitar esse momento aqui, para poder dizer: muito obrigada, Fábio meu querido, por ter tirado esse tempinho para conversarmos, e por me ajudar tanto com essa leitura, e com essas palavras. Foi incrível! ?.
E depois dessa importante compreensão, ainda assim, eu preciso dizer que esse continua sendo um livro que não foi para mim. E eu quero poder expor aqui o que nele não me encantou, porque muito embora ele possa ser um livro excelente para alguns, poderão haver outras pessoas que também terão as mesmas dificuldades que eu para se conectarem com a história.
Muito embora esse seja um livro com um conteúdo repleto de termos científicos ligados à física, à química e à matemática, e eu não tenha um bom desempenho em raciocínio lógico-matemático, não foi exatamente essa questão que não me permitiu uma maior conexão com a história. Porém, a verdade é que desenvolver diálogos exclusivamente em termos científicos, deixa a história mais lenta e um tanto cansativa para o leitor. Isso é fato!
Um outro ponto que me incomodou demais, foi essa neura de que, ficando no espaço por dias, os astronautas e cientistas entrariam em depressão e estariam suscetíveis ao suicídio. Gente? Mas com todo o preparo inicial, eles não teriam trabalhado o psicológico deles antes da viagem? Sem contar que, mas que tanta carência essa desse povo que não consegue nem passar um tempo mais voltado para o trabalho (porque algumas coisas acabam acontecendo e necessitando da atenção dele), ou mesmo buscando por um jogo de xadrez ou uma leitura para distrair a mente nos momentos vagos? Gente? não é assim que funciona não. Até porque o propósito em si, já é uma fonte de motivação para manter a mente voltada para algo maior, deixando de lado essas necessidades afetivas individuais, que até são importantes, mas não na mesma frequência de uma criança pequena.
Como eu já disse anteriormente que o autor não irá se aprofundar demais nos personagens, quero apenas fazer uma colocação sobre algo que me incomodou bastante nessa história: o perfil estereotipado e clichê dos cientistas. Em alguns dos personagens secundários, eu me sentia lendo sobre uma versão mal desenvolvida de um Sheldon Cooper, ou um Howard Wolowitz (personagens do seriado ?The Big Bang Theory?), o que não foi muito assertivo, na minha humilde opinião. Mas confesso que de todos os personagens, o que mais me incomodou, foi o desenvolvimento da personagem Dra. Eva Stratt. Eu não consigo entender essa tendência que existe em descrever mulheres inteligentes e com poder, como pessoas altamente calculistas, frias e robotizadas.
Ao longo da minha vida, eu tive o prazer de trabalhar com mulheres em cargos de chefia extremamente inteligentes (uma, inclusive, foi a primeira brasileira a escrever um livro de informática para crianças, quando percebeu a deficiência que havia desse conteúdo para esse público específico), e nem por isso elas deixaram de ser femininas, nem de constituir suas famílias, tendo até sido mães bem dedicadas, sem contar em toda a empatia e assertividade que demonstravam ao desenvolver pessoas. Sendo assim, é totalmente possível (e permitido!) ser uma mulher inteligente sem deixar de ter características femininas, assim como ser profissionalmente realizada e ainda poder ser feliz e ter bons relacionamentos afetivos.
Precisamos compreender que assim como um baixo desempenho em raciocínio lógico-matemático (como o meu, por exemplo) é fruto de um baixo estímulo ao longo da vida, as nossas relações interpessoais também precisam ser experenciadas de forma corajosa, para que possamos ter bons feedbacks que nos ajudem a sermos mais assertivos e nos envolvermos com mais profundidade.
O mundo científico tem extrema importância para vivermos melhor e com mais qualidade. Mas de nada adianta, se não compreendermos que a nossa vida, mais do que se ter um propósito, é pautada nas nossas relações. Uma das ordens naturais da vida é a de pertencer, primeiramente a nossa família, e posteriormente aos grupos com os nossos pares, e depois a uma relação afetiva.
Ninguém é uma ilha, e mesmo que cada um tenha o seu nível de interação onde demandará mais ou menos necessidades de afeto e carinho, ainda assim, precisamos uns dos outros, pois somente com eles é que crescemos e evoluímos como seres humanos. Além de nos sentirmos mais completos, confiantes, e mais dispostos a nos jogarmos no mundo e irmos cada vez mais além.
Não poderei me estender muito, para não dar nenhum spoiler, mas fica aqui uma pequena colocação sobre o final: quando deixamos tudo em prol do nosso propósito, nos tornamos pessoas além das nossas necessidades pessoais, para vivermos unicamente para e pelo serviço aos outros. E isso não é para todos nós (e certamente não é para mim!), mas para um grupo seleto de pessoas que deixam a si mesmo, em prol de outros. E sobre esse ponto, eu preciso dizer: Well done, Andy! Well done!!