Val 27/04/2024
Cidade nas Nuvens
Ao iniciar seu livro Cidade nas Nuvens, o premiado escritor norte americano Anthony Doerr (autor de Toda Luz que não Podemos Ver) leva-nos ao um ambiente futurista onde, em contraste, uma menina usa recursos rudimentares para seu divertimento. Como esta história, o autor envolve-nos em mais quatro delas, tal qual contos isolados tendo um fio condutor: um livro muito antigo sobre uma fábula e passagens por bibliotecas.
Com uma belíssima escrita, Doerr arrasta o leitor por fantasias adicionadas em realidades, em planos temporais distintos, nesta potente ficção. Situações de suspense entremeiam-se à magia de outras vividas por crianças. Cada criança tem seu problema peculiar e seu sonho particular permanentemente ameaçados pela vida real que os abarca.
E de forma singular, naturalmente no desenrolar das histórias, personagens e situações vão se encaixando e engrenando, como no preparo culinário quando se vão adicionando os ingredientes para, enfim, se preparar um bolo delicioso.
Dos leviatãs ao homem moderno, passando pela conquista de Constantinopla, a guerra da Coreia e por uma nave espacial, nada escapa à criatividade de Doerr, num livro de literatura moderna muito bem elaborado e com excelente escrita. Enquanto coloca de forma certamente crítica alguns aspectos da vida moderna, principalmente tecnológica, Doerr surpreende-nos com uma reviravolta no enredo, fazendo uma importante denúncia sobre a manipulação de informações e imagens via internet.
Considero esta obra como revolucionária, além de contestadora, pois apresenta uma severa crítica ao fanatismo ecológico desmesurado, ao crescente embuste produzido pela tecnologia para atender a interesses específicos que não os verdadeiros, e outras fraudes sobre a sobrevivência da humanidade.
A competência do autor na formação dos protagonistas é deslumbrante, envolvendo aspectos históricos que parecem estar fora do contexto mas que vão encaixar-se perfeitamente, - às vezes, até de forma surpreendente - na construção do enredo. Com o destaque à resiliência humana no uso correto da história para preservar culturas e inspirar as novas gerações.
Como os fragmentos do “livro protagonista”, Doerr fragmenta sua história em cinco protagonistas. E, como na história, ele faz com que o leitor monte um imenso e belo quebra-cabeças. E assim esta obra emociona e brilha excepcionalmente ao ser um “hino ao livro”, como reputa o próprio autor.
Valdemir Martins
27.04.2024
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