Michele 07/06/2021Não Existe Obra mais “Machadiana”Helena é definido como o livro mais romântico e menos “machadiano” de Machado de Assis, publicado em 1876, definitivamente este romance é muito diferente dos que já li do autor, que cronologicamente são posteriores, porém ouso discordar da opinião da crítica, porque neste romance estão presentes todas as características que consegui absorver de minha experiência machadiana: a inteligência, a filosofia, a política, a trama, personagens fortes e a dúvida.
A dúvida é, com total certeza, a maior originalidade de Machado e ele nos põe em dúvida neste romance, duvida acerca de Helena, do carinho entre os irmãos, da índole de terceiros, etc. Essa dúvida persiste em você até as páginas finais com o grande final da trama (e que final!).
Definitivamente, Machado não é para amadores, conforme dito em outra resenha não há nada que se possa falar de Machado que não seja redundante, porém desde que comecei a ler a sua obra consigo me surpreender cada vez mais com o escritor que tivemos e, ainda mais, na época em que existiu.
Um dos pontos que mais me chamaram atenção neste livro foi em relação a decisão dos personagens Pais, temos como figuras paternais neste romance o Conselheiro como pai de Estácio, Dr. Camargo como pai de Eugênia e Salvador como pai de Helena (sim, spoiler).
As decisões que estes personagens tomam no decorrer do enredo causam as tribulações dos personagens centrais, decisões estas que podem até ser póstumas. Temos o Conselheiro que em razão do carinho nutrido por Helena decide nomeá-la sua filha e acaba criando impedimentos legais ao coração de seus dois filhos, Dr. Camargo credita seu amor mais genuíno a filha e a pretexto dele é capaz de chantagear e ameaçar, por fim, temos Salvador que abdica do amor fraternal para poder ver a filha usufruir daquilo que nunca lhe poderia proporcionar.
Vínculo Afetivo, Egoísmo e Abdicação. Estes sentimentos correlacionados ao amor paternal das figuras acima trouxeram diversas consequência a vida de seus filhos: Estácio e Helena nunca puderam vivenciar aquilo que sentiam, Eugênia poderá ter sido colocada em um casamento sem qualquer identificação, em que pese tenhamos um desfecho sem conclusão a sua personagem.
Invariavelmente o mesmo acontece em nossas vidas, e traz a reflexão de quanto e até que ponto somos guiados pelas decisões familiares e até que ponto nós somos responsáveis pelos acontecimentos, afinal, Helena consentiu em continuar sendo filha do Conselheiro e até Estácio em sua decisão final decidiu respeitar a vontade do pai em detrimento ao amor que sentia.
Será que Machado queria realmente fazer essa crítica a nossa sociedade ou só mesmo queria nos apresentar um amor trágico como os de Shakespeare? A dúvida persiste mesmo após a obra... coincidência? Não. Este é Machado.