Jude Duarte 12/05/2024
Ela sou eu
-Eu devia estar empolgada como a maioria das outras garotas, é verdade, mas eu simplesmente não conseguia. Eu me sentia muito prostrada e muito vazia, como deve se sentir um furacão quando avança bem no meio do rebuliço que o cerca.
-Senti que eu estava derretendo entre as sombras, como se fosse o negativo de uma pessoa que eu nunca tinha visto na vida.
-O silêncio me deixou deprimida.
Não era o silêncio do silêncio.
Era o silêncio que vinha de mim.
-Eu vi minha vida se ramificando à minha frente como a figueira verde daquele conto.
Da ponta de cada galho, como um figo roxo e gordo, um futuro maravilhoso me chamava com uma piscadinha. Um figo era um marido numa casa feliz com filhos, e outro figo era uma poeta famosa e outro figo era uma professora universitária brilhante, e outro figo era Ee Gee, a editora genial, e outro figo era a Europa, a África e a América do Sul, e outro figo era Constantin, Sócrates e Attila e mais um monte de outros amantes com nomes estranhos e profissões excêntricas, e outro figo era uma campeã olímpica de remo, e acima e além desses figos havia muitos outros que eu não conseguia enxergar direito.
Eu me vi sentada entre as raízes dessa figueira, morrendo de fome, só porque não conseguia decidir qual dos figos escolher. Eu queria todos eles, todos, mas escolher um era perder os outros e, enquanto eu ficava ali parada, incapaz de tomar uma decisão, os figos iam murchando e ficando escuros, e, um a um, começavam a se espatifar aos meus pés.
-Toda vez acontecia a mesma coisa:
Eu via de longe um homem que não tinha nenhum defeito, mas quando ele chegava mais perto eu percebia que ele era muito inferior ao que eu imaginara.
Esse era um dos motivos pelos quais eu não queria me casar. A última coisa que eu queria era ter segurança infinita e ser o ponto de partida de uma flecha. Eu queria novidade, eu queria emoção, eu queria me lançar eu mesma em todas as direções, como as flechas coloridas dos fogos de artifício de 4 de Julho.