Lílian 28/12/2012DL 2012 - DezembroComecei minha vida de leitora com a poesia. E isso devo aos ótimos professores de língua portuguesa que tive durante o segundo grau. Pode soar um exagero, mas essa relação com a poesia começou na escola, numa aula na qual descobri - e passei a amar- a obra de Ferreira Gullar, um dos meus poetas favoritos. Acontece que, após o segundo grau, meu foco de leitura se deslocou para os livros de história da graduação. Bom, tudo isso pra dizer que eu lia muita poesia ( além do Gullar, Drummond,Pessoa, os árcades mineiros e Gregório, sim, muito barroco na minha estante)e que, com o tempo, perdi esse hábito.A participação no desafio literário, além de possibilitar um planejamento de leitura, colaborou para eu voltasse a ler poesia. E numa tarde vasculhando o acervo da Mário de Andrade, escolhi " Poemas" de Wislawa Szymborska, polonesa, vencedora do Nobel de Literatura. O que me chama a atenção na escrita de Szymborska é a sutileza e simplicidade, algo que considero muito raro e sofisticado. Some-se à isso, uma dose de ironia e você terá uma pequena amostra do universo da autora. Confesso que os poemas de cunho mais explicitamente político não chamam a minha atenção. Dentre todos, sugiro a leitura de " A curta vida de nossos antepassados", meu favorito.É com ele que pretendo, um dia, quem sabe?, iniciar uma aula de história. Vejam que genial e singelo:
Poucos chegavam aos trinta
A velhice era privilégio das pedras e das árvores.
A infância durava tanto quanto a dos lobos.
Tinham de apressar-se, acompanhar a vida
antes de o sol se pôr,
antes de a primeira neve cair.
Progenitoras de treze anos,
Meninos de quatro a andar aos ninhos pelos juncais,
aos vinte, batedores das caçadas,
ainda mal eram gente e logo deixavam de o ser.
Os extremos do infinito rapidamente se tocavam.
As bruxas mastigavam palavras mágicas
ainda com todos os dentes da juventude.
O filho amadurecia aos olhos do pai,
mas era a caveira do avô que via o filho nascer.
De resto, não contavam os anos.
Contavam redes, tachos, tendas e machados.
O tempo, tão generoso com as estrelas do céu,
estendia-lhes uma mão cheia de nada
para logo a retirar como que arrependido.
Mais um passo, mais dois
ao longo do rio refulgente,
que nas trevas nasce e nas trevas se perde.
Não havia um instante a perder,
perguntas adiadas ou revelações tardias,
se não tivessem já sido vividas.
A sabedoria não podia esperar cabelos brancos,
tinha que ver com clareza antes de se fazer luz,
ouvir toda a voz antes de se propagar.
O bem e o mal,
pouco dele sabiam, porém tudo:
quando o mal triunfa, o bem oculta-se;
quando o bem se manifesta, o mal fica à espreita.
Um e outro invencíveis,
inseparáveis de uma vez para sempre.
E por isso, na alegria – a angústia misturada,
no desespero – sempre uma esperança calada.
A vida, mesmo a mais longa, será sempre curta.
Curta demais, para aqui algo acrescentar.
Wislawa Szymborska, “A curta vida dos nossos antepassados”.