Bruno.Dellatorre 27/04/2019Uma jóia que encontrei por acasoConfesso, desdenho um pouco da poesia. Fui ler este volume contendo algumas poesias da poeta polonesa Wislawa Szymborska só para fazer uma leitura rápida e fui surpreendido com um livro complexo a ser lido e relido, não necessariamente do começo ao fim, e sim relido por partes. Há poesias específicas que me marcaram, mas uma que me impactou ao extremo e mudou minha vida.
Me desculpe o acaso por chamá-lo necessidade. Me desculpe a necessidade se ainda assim me engano. Que a felicidade não se ofenda por tomá-la como minha. Que os mortos me perdoem por luzirem fracamente na [memória. Me desculpe o tempo pelo tanto de mundo ignorado por [segundo. Me desculpe o amor antigo por sentir o novo como [primeiro. Me perdoem, guerras distantes, por trazer flores para casa. Me perdoem, feridas abertas, por espetar o dedo. Me desculpem os que clamam das profundezas pelo disco [de minuetos. Me desculpe a gente nas estações pelo sono das cinco da [manhã. Sinto muito, esperança açulada, se às vezes me rio. Sinto muito, desertos, se não lhes levo uma colher de água. E você, falcão, há anos o mesmo, na mesma gaiola, fitando sem movimento sempre o mesmo ponto, me absolva, mesmo se você for um pássaro empalhado. Me desculpe a árvore cortada pelas quatro pernas da mesa. Me desculpem as grandes perguntas pelas respostas [pequenas. Verdade, não me dê excessiva atenção. Seriedade, me mostre magnanimidade. Ature, segredo do ser, se eu puxo os fios das suas vestes. Não me acuse, alma, por tê-la raramente. Me desculpe tudo, por não poder estar em toda parte. Me desculpem todos, por não saber ser cada um e cada [uma. Sei que, enquanto viver, nada me justifica já que barro o caminho para mim mesma. Não me julgue má, fala, por tomar emprestado palavras [patéticas, e depois me esforçar para fazê-las parecer leves.