Itamara 12/07/2021"Pertenço a uma geração que acreditou. Eu acreditava".Os poemas contidos nessa obra são de uma beleza única, apesar de inevitavelmente lembrar nosso poeta brasileiro Carlos Drummond, citado inclusive no próprio texto inicial. Durante a leitura, senti vontade de recitar, encenar, ler em voz alta. Li quase todos mais de uma vez e na minha tentativa de grifar os melhores poemas, acabei destacando quase todos.
O prefácio da tradutora Regina Przybycien é muito elucidativo e apresenta informações importantes não só sobre a autora, mas também sobre o próprio ofício de tradução. Além disso, explica sobre o contexto e processo de criação de alguns poemas. Wislawa, pelo que nos é apresentado, foi uma escritora memorável, representativa, cheia de personalidade, apesar de ser muito reservada.
Dentre todos os poemas, destaco meu preferido (Filhos da época):
Somos filhos da época
e a época é política.
Todas as tuas, nossas, vossas coisas
diurnas e noturnas,
são coisas políticas.
Querendo ou não querendo,
teus genes têm um passado político,
tua pele, um matiz político,
teus olhos, um aspecto político.
O que você diz tem ressonância,
o que silencia tem um eco
de um jeito ou de outro político.
Até caminhando e cantando a canção
você dá passos políticos
sobre um solo político.
Versos apolíticos também são políticos,
e no alto a lua ilumina
com um brilho já pouco lunar.
Ser ou não ser, eis a questão.
Qual questão, me dirão.
Uma questão política.
Não precisa nem mesmo ser gente
para ter significado político.
Basta ser petróleo bruto,
ração concentrada ou matéria reciclável.
Ou mesa de conferência cuja forma
se discutia por meses a fio:
deve-se arbitrar sobre a vida e a morte
numa mesa redonda ou quadrada.
Enquanto isso matavam-se os homens,
morriam os animais,
ardiam as casas,
ficavam ermos os campos,
como em épocas passadas
e menos políticas.