Natália Tomazeli 09/10/2021A Honestidade e Coragem de Sefi Atta"Os direitos humanos nunca foram importantes até os direitos dos homens serem ameaçados. Mas não há nada na nossa constituição que fale dos direitos em casa. Mesmo que o exército parta, nós ainda temos que responder aos nossos maridos. Então o que as mulheres tem a dizer?"
Eu amo tanto essa frase. E amo tanto o jeito como Sefi Atta se expressa através desse livro. Por vezes, acho que nós mulheres somos suaves demais quando o assunto é falar de nossas próprias dores, de nossos próprios direitos, na verdade. É tão difícil, ainda mais hoje, numa época onde temos "que pisar em ovos", onde, sempre temos que "maternar" suprindo as demandas de todo grupo social, menos o nosso, onde nossa vivência não tem espaço, porque "mas e fulano? porque não incluiu o fulano?", achar quem diga em alto e bom tom tudo aquilo que está trancado na garganta, tudo aquilo que é tão vivo quanto uma ferida aberta e pulsante. E eu achei, achei a Sefi Atta...
Até hoje eu me pego pensando muito sobre a Sefi, sobre a coragem e a crueza dela. Que tipo de mulher é tão corajosa assim? Que tipo de mulher nos afaga com uma narrativa completamente desnuda de todo a complacência? Essa mulher é com certeza Sefi Atta. Imagina que ela simplesmente não se preocupa em nenhum momento em agradar, na verdade tudo o que ela escreve tem certa fúria, foge totalmente da sutileza. É tudo escancarado, colocado em todas palavras, doa a quem doer. Sefi sabe bem o que escreve, o que expressa. Sabe que o peso de suas palavras é todo o grito que milhares de mulheres africanas não podem emitir. E isso tudo faz dela o real significado de "força". Esse é um livro forte, com uma mensagem forte.
Eu sei que devia sentir raiva, tristeza, revolta, lendo tudo que aconteceu com Enitan e Sheri, mas eu senti que alguém entendia o que estava acontecendo, que alguém enxergava o mundo como ele é, como ele necessita ser visto. Esse alguém era Sefi Atta. Eu admiro demais Sefi Atta, demais! Depois da leitura desse livro, conheci muitas Sefis, uma delas tão pungente quanto: Audre Lorde. Sem mulheres assim, mulheres tão realmente sagazes e tão lúcidas da realidade, acho que nada poderia ser expressado com tamanha veracidade e honestidade. E nenhuma mudança pode ser feita sem que tenhamos vozes como as delas, vozes transparentes e bravas!
Acho que esse texto nem foi uma resenha, mas é que esse livro é como um grito que a tanto tempo foi contido. Um grito que nem todo mundo quer, mas com certeza precisa ouvir.
"Só adquirimos um senso de continente ou de nação em um país como o meu quando viajamos para o exterior. Diante de um mundo dividido entre Oriente e Ocidente, não havia lugar para nós. Diante de um mundo cheio de classificações, nosso lugar era entre os últimos, entre o Terceiro Mundo e o Quarto. Um povo nobre. Uma cultura selvagem. Era um concerto pop atrás do outro em prol dos africanos famintos. Livros inteiros eram dedicados à salvação da genitália das africanas. Seria bom que essas mulheres pudessem ler os livros para poder criticá-los: isso está certo, isso está incorreto, isso não faz sentido. Mas a África não podia ser salva através de caridade."