Fefa 10/10/2013
Apaixonada por animais, Sara Gruen já havia lançado dois outros enredos, que se baseavam na relação entre pessoas e cavalos, quando publicou Água para elefantes, em 2006. O livro foi o primeiro título da autora publicado no Brasil e é resultado de uma vasta pesquisa sobre o universo do circo norte-americano. A composição das personagens e situações que enredam a trama é inspirada, inclusive, em anedotas e histórias reais que Sara juntou ao longo de seu estudo.
Deparamo-nos, então, com Jacob Jankowski, paciente de uma casa de repouso, que vive entre os horários dos medicamentos e os cuidados da enfermeira. Com a chegada de um circo à cidade, ele volta ao passado para nos descrever sua própria experiência com o mundo dos espetáculos. A partir daí, já entendemos que os capítulos se alternarão entre a narrativa do Jacob atual e do Jacob de 1931, aos 23 anos.
A história toma forma com o trágico acidente que leva seus pais à morte. Órfão e sem herança, ele foge num ato desesperado de deixar a dor para trás e abandona, assim, uma promissora carreira de veterinário, cujo diploma estava, apenas, à distância dos exames finais. Sem perspectivas sobre seu futuro, o jovem não hesita e embarca clandestinamente em um trem em movimento – o Esquadrão Voador do Circo Irmãos Benzini, o Maior Espetáculo da Terra.
Longe de entreter o leitor com a magia dos picadeiros ou distrai-lo com uma história de amor açucarada entre um ex-estudante de veterinária e a esposa de seu chefe, os eventos seguintes inquietam pela crueldade e frieza dos acontecimentos. Com os Estados Unidos assolados pela Grande Depressão, um dos únicos divertimentos se apoia nas excentricidades e encantos dos números circenses, mas é nos bastidores da grande tenda que as páginas se recheiam.
Em uma época que a participação de animais nos shows é oportuna e esperada pelo respeitável público, nos defrontamos com a realidade sofrível desses bichos, constantemente humilhados e torturados. Rosie que o diga! A doce e brincalhona elefanta, que, a princípio, é considerada burra, esconde uma sagacidade capaz de roubar qualquer “cena”, mesmo tendo tão pouco espaço na história.
Não só os animais, operários e artistas parecem significar um mero negócio para o diretor do circo, Tio Al, que, ao menor sinal de descompostura com suas regras, não pensa duas vezes em jogar vidas humanas para fora do trem... em movimento. Embora seja o todo poderoso do Circo Irmãos Benzini, Tio Al não acrescenta muito valor à trama, podendo ele mesmo ter sido descartado.
Já o detestável August, superintendente dos animais e marido da bela Marlena, por quem Jacob se apaixona, é uma figura complexa e por isso mesmo chama a atenção. Sua personalidade bipolar e gênio intempestivo são responsáveis por garantir o pouco da ação e suspense do livro, já que o romance protagonizado por Jacob e Marlena parece não sair do lugar. O que por um lado agrada devido à ausência de pieguice, por outro, se torna maçante.
Cabe aqui, no entanto, destacar a reviravolta da narrativa: uma vez que as tagarelices de um senhor de 93 anos deveriam figurar como pano de fundo de suas aventuras de juventude, sua condição senil acaba se tornando um ponto muito mais atraente. Através de boas doses de sarcasmo, a autora conseguiu passar de maneira natural na narração a essência masculina necessária à personagem e os conflitos internos da idade.
No fim, a sensação é de que cada acontecimento narrado, de forma isolada, tem sua carga de importância se pensarmos que muitos deles foram tirados diretamente da realidade. Contudo, todos esses episódios, juntos, não convencem como história. Quem não se importar com a falta de clímax, consegue, mesmo que obstinadamente, chegar até as últimas páginas.
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