Fernanda631 05/07/2023
A Maldição do Vencedor (Trilogia do Vencedor #1)
A Maldição do Vencedor (Trilogia do Vencedor #1) foi escrito por Marie Rutkoski.
A autora Marie Rutkoski nos apresenta o mundo conflituoso, vivido pelos olhos de Kestrel, e trágico, vivido pelos olhos de Arin, os protagonistas da história. Herran é um território recentemente ocupado pelos valorianos e seu povo, os herranis foram escravizados no processo. Arin é um desses escravos e Kestrel, uma valoriana, filha do general, arremata esse escravo num leilão emocionante onde o jovem chama a sua atenção, porque foi apresentado como cantor.Possui uma trama complexa, bem orquestrada e incrivelmente bem desenvolvida.
Kestrel vive em uma sociedade perfeita. Sendo uma valoriana, filha do general mais renomado que o império já possuiu, a jovem vive sob grandes expectativas, incertezas e a ânsia pela própria liberdade. Em um dia comum, contrariando a própria racionalidade, Kestrel compra um escravo num leilão da cidade, e essa decisão acaba por mudar sua vida completamente; a presença de Arin mexe com seus sentidos e sentimentos, ao mesmo tempo em que uma trama complexa começa a se erguer por trás dos dois. Uma rebelião se aproxima, e a chance da conquista da tão sonhada liberdade pelos herranis - povo escravizado pelos valorianos - cresce nas sombras da cidade.
A narrativa constrói essa jovem aristocrata orgulhosa, ao mesmo tempo em que desdobra a personalidade dela em algo doce e sutil. Ela não é uma valoriana perigosa como o pai, ou desinteressada ao sofrimento alheio como muitos dos cidadãos da cidade. Kestrel é elegante e afiada, temida e temerosa. Kestrel é ambiciosa, sombria e extremamente corajosa.
Ela vive sob vigilância constante do pai, uma figura de poder muito respeitada pela sociedade valoriana, ao mesmo tempo em que constrói as próprias ambições. Kestrel quer mais do que se tornar uma soldada nas frontes de batalha do seu povo, assim como se recusa a escolher um marido para constituir família. O pai lhe deu uma dessas opções, e ela precisa decidir o que é melhor para ela enquanto os conflitos do livro começam a crescer.
Tudo começa com o leilão. Kestrel compra A partir do momento em que Arin entra em sua vida, as coisas se tornam incertas e de um perigo constante. Não que o jovem escravo seja perigoso, mas a presença dele, o desafio que Kestrel aceitou ao tomá-lo para si criam uma subtrama muito bem desenvolvida. A tensão no início do convívio entre eles se dissolve lentamente, num ritmo agradável, enquanto a autora nos entrega detalhes sutis sobre como a afeição dos dois começa a existir.
A música é um elemento poderoso entre os dois jovens; a liberdade que ela trás, o que ela significa para ambos. Kestrel não deveria tocar, uma vez que essa é a tarefa dos escravos, a de entreter e a de agir, e Arin se recusa a cantar porque isso o rememora dos tempos livres e da época em que seu povo podia escolher o que fazer. A forma como os dois lidam com essa questão, como ela se torna algo em comum conforme eles se aproximam.
A Kestrel é destemida e fria, mas igualmente temerosa e cheia de emoções. A vida na aristocracia criou uma de suas muitas facetas, e eu fiquei encantada com a qualidade do crescimento da personagem durante a história. A força dela não deriva do poder físico, mas do seu palavreado e das suas atitudes.
Ela é manipuladora quando necessário, sincera quando deseja. Sabe jogar conforme o jogo da política, e seu relacionamento de respeito mútuo com o pai criou uma estrategista nata. Gostei de como o livro não tornou o general um vilão, ainda que sua postura rígida e centrada possam tê-lo vendido como tal inicialmente. Ele é um pai e um soldado, e essas duas designações acabam colocando ele e Kestrel em embates interessantes de acordo com o passar a trama.
Arin, por outro lado, começa rústico e misterioso e acaba se desdobrando em um coração puro e incerto. Ele é um rapaz ansioso pela liberdade, disposto a tudo por ela, que de repente vê seu coração inclinando-se na direção de uma aristocrata, uma garota da raça que ele jurou derrubar. A história de como Arin se tornou escravo até seu convívio com Kestrel foram incríveis.
A pureza dentro desses dois também é impressionante. Arin e Kestrel são dois jovens de realidades tão distintas, mas que desenvolvem um relacionamento importante dentro da trama. Esse livro não existiria sem o amor dos dois.
O ponto maravilhoso desse casal é como o romance começa sutil e se torna algo grandioso que em nenhum momento atrapalha o desenvolvimento dos personagens. A rebelião dentro de cada um ainda existe; a diferença de ideias e de escolhas molda suas personalidades. Arin é um escravo, Kestrel é uma valoriana livre, e esses papeis permanecem neles até o fim, independente das reviravoltas que a trama trás.
Possuem ideais tão contraditórios, ao mesmo tempo em que dividem ideias semelhantes.
O sentimento e a confiança dos dois são colocados à prova quando uma rebelião acontece e a guerra entre herranis e valorianos é iminente. A realidade de ambos muda drasticamente e Kestrel se vê sozinha em meio ao caos que o mundo deles se transformou. Diante da nova realidade ela tem a oportunidade de conhecer o verdadeiro Arin, seu passado quando não era escravo e todos os motivos que o levaram a tomar as decisões que culminaram na situação presente deles.
A sociedade construída pela autora é sombria e bastante assustadora. Os dois lados têm erros e acertos; os valorianos tomaram as terras herranis no passado, e construíram seu império com elegância, poder e temor. Transformaram os antigos donos daquele espaço em seus escravos, o que criou aquela ânsia revolucionária nos subordinados. Os herranis, por outro lado, eram um povo rico em sabedoria e civilidade, o que ainda carregam consigo - e o que usam para o estopim da revolução.