Carol 21/02/2021Impressões da CarolLido: Esboço {2014}
Autora: Rachel Cusk {Canadá, 1967-}
Tradução: Fernanda Abreu
Editora: Todavia
192p.
Lido para o #projetoferranteindica, da @alineaimee, "Esboço" é daqueles livros que dividem opiniões. Ame-o, odeio-o, ache-o chocho, um livro contemporâneo provocante ao trazer, para o escrutínio, a ideia de escuta, mais especificamente, a escuta feminina.
Não existe um enredo, propriamente dito. Faye - cujo nome só iremos descobrir no penúltimo capítulo - é uma escritora recém-divorciada que viaja a Atenas para ministrar uma oficina de escrita literária, durante dois dias.
Nas 192 páginas do romance, os personagens nos são apresentados através da escuta dessa protagonista, por meio de conversas, confissões, relatos, tudo filtrado, de alguma forma, por ela.
É um movimento psicanalítico, se pensarmos bem. O psicanalista deve escutar seu paciente, evitando especulações, para melhor compreender esse inconsciente que fala, já dizia Freud.
Apesar de não haver uma descrição de Faye, seu contorno vai sendo esboçado a partir dessas interações, em pequenos fragmentos, quando, por exemplo, um dos seus filhos lhe liga por não ter encontrado o caminho para a escola.
É interessante apontar, também, a relação de uma escuta atenta para o fazer literário. No curso de escrita que ministra, Faye promove exercícios nos quais os alunos escutam os relatos de cada um e são estimulados a interagir. A contação de histórias está na gênese de toda literatura, afinal.
Fui surpreendida positivamente por essa leitura e estou no time dos que vão continuar a trilogia (Trânsito e Kudos).
"Cada um deles desejava mais do que tudo ser declarado certo, e o outro errado, mas era impossível atribuir culpa de modo completo a qualquer um deles. E acabei me dando conta, falei, de aquilo jamais poderia ser resolvido, não enquanto o objetivo fosse estabelecer a verdade, pois não existia mais uma única verdade, a questão era essa. Não existia mais uma visão comum, ou sequer uma realidade comum. Cada um deles agora via as coisas somente de sua própria perspectiva; só havia um ponto de vista." p. 65.