FelCuesta 19/06/2022
Excelente, ácido e nada clichê!!
Um livro surpreendente que merece resenha destacada é este Os Supridores do escritor nacional contemporâneo, José Faleiro.
A trama apresenta dois caras jovens e pobres, Pedro e Marques, como tantos outros no Brasil, que trabalham na função pouco glamourosa de empacotadores (supridores) de um supermercado de Porto Alegre e estão exaustos da rotina sofrida e do salário minguado a ponto de decidem arriscar um plano ousado para saírem da linha marginal de pobreza e ganharem um pouco de grana. A ideia é vender maconha em uma área onde essa droga perdeu espaço para o crack e a cocaína e assim restabelecerem um nicho desse mercado.
Embora pudesse cair num clichê, o livro nos apresenta uma narrativa dinâmica, bem humorada e inventiva sobre a saga dos amigos empreendedores. Com personagens marcantes pelos quais vamos nos afeiçoando e alternando uma linguagem erudita do narrador com as gírias da periferia sulista (um dos pontos altos do romance) desenvolvidas nas falas dos personagens, a obra segue um arco crescente de tensão que prende o leitor até o final, quando as coisas, digamos, não saem exatamente como planejado.
Outro mérito do livro, a meu ver, é a cutucada sutil em certos discursos repetidos na sociedade de maneira onipresente, como por exemplo o da idealização do empreendedorismo e de uma suposta meritocracia acessível a qualquer um, como se bastasse querer muito e trabalhar duro para conquistar alguma coisa na vida e crescer economicamente. Durante a leitura, vemos que o modelo de business idealizado pela dupla é, no fundo, uma grande ironia com os que pensam que essa trajetória do empreendedorismo bem sucedido pode ser eficiente como regra, e não quase sempre devido ao privilegio de casta que devem ja ter previamente aqueles que tentam avançar por esse nicho, tanto quanto a origem anterior de seus dotes, especialmente se a atividade for licita e exigir capital inicial.
Os supridores é uma leitura que consegue ser densa, ágil e ao mesmo tempo bastante didática àqueles que não enxergam para muito além da sua bolha.