Fernanda631 23/01/2023
Garotas em Chamas
Garotas em Chamas foi escrito por C.J. Tudor e foi publicado em 22 de março de 2021.
A reverenda Jack Brooks, mãe solteira de uma jovem de quatorze anos, chega a esse vilarejo em busca de um recomeço. Em vez disso, encontra um lugar tomado por conspirações e segredos, e é recebida com um estranho pacote de boas-vindas: um kit de exorcismo e um bilhete: Não há nada escondido que não venha a ser descoberto.
Quanto mais Jack e sua filha, Flo, exploram a cidadezinha e conhecem seus estranhos moradores, mais as duas se aprofundam em feridas antigas, mistérios e suspeitas. E, quando Flo começa a ver meninas ardendo em chamas, fica evidente que há fantasmas por ali que se recusam a descansar em paz."
A pequena cidade de Chapel Croft guarda uma história interessante, para dizer o mínimo. Garotas em Chamas são bonecas de gravetos características do lugar, são feitas para homenagear os Mártires de Sussex - oito pessoas queimadas na fogueira durante a expurgação de protestantes (1553-58) da rainha Mary. Duas garotinhas estavam entre os mártires. Essas Garotas em Chamas são incendiadas em uma cerimônia que acontece todos os anos no aniversário da perseguição. Uma tradição que, para algumas famílias, significa uma honra, enquanto para outras é um símbolo de violência e tradicionalismo.
O reinado de Maria I, na Inglaterra, foi marcado por uma intensa perseguição a protestantes e outros dissidentes religiosos. Estima-se que de 280 a 300 protestantes foram condenados à fogueira. Entre os registros históricos, vamos encontrar mais facilmente em pesquisas os chamados Mártires de Oxford (três bispos anglicanos julgados e queimados vivos nos anos de 1555 e 1556) e os Mártires de Lewes (17 protestantes também queimados vivos na região de East Sussex entre 1555 e 1557). Anualmente, em diversas regiões da Inglaterra, há procissões em homenagem à memória desses mártires.
Cidades pequenas vivem por suas tradições, muitas delas se remetendo às famílias mais antigas do local. Muitas vezes a história dessas cidades é contada pela história dessas famílias. Esse é o caso de Chael Croft e de seus habitantes. Quando Jack Brooks, nova reverenda designada para atuar na região, e sua filha de 15 anos chegam à cidade, elas precisam lidar com o conflito de gerações, o estranhamento do vilarejo ao receber uma mulher para atuar como vigária em um lugar tão antiquado, e acontecimentos macabros.
O livro já começa inquieto, somos apresentados a acontecimentos arrepiantes e instigantes desde a primeira página. Garotas em Chamas brinca com o sobrenatural e o suspense a cada parágrafo e se mostra uma leitura fácil e rápida logo de cara. A ambientação é feita de imediato e o livro conta com muitos diálogos para fazer fluir a história. É um livro pouco descritivo e pouco complexo, o que faz com que seja facilmente assimilado por leitores que estão começando a se aventurar no gênero.
Todos os capítulos terminam com cliffhangers, além de serem bem pequenos, com pouco mais de cinco, seis páginas, o que faz com que aquela vontade de ler "só mais um capítulo" surja o tempo todo.
Garotas em Chamas traz uma autora bem mais madura no domínio narrativo do que vimos nos três livros anteriores. Até porque, vale destacar, a trama aqui é mais ousada, traz a religião do interior para o centro dos acontecimentos e aborda questões como saúde mental. Além disso, temos uma protagonista feminina bem ambígua, humana em seus erros e acertos, e que carrega o colarinho clerical para deixá-la “passar despercebida pelos outros”.
Temos nessa obra um sacerdote mulher na obra, e para os que não estão familiarizados vale informar que a Igreja Anglicana permite a ordenação de mulheres como padres, para usar um termo mais conhecido nosso.
A cidadezinha de Chapel Croft, existente no mundo real, é o palco dessa história que tem ares de sobrenatural, mas cujos pés ficam mesmo presos na realidade. E tem uma miscelânia de tramas se sobrepondo.
A história dos mártires da cidade que traz duas garotinhas queimadas junto aos adultos; o desaparecimento não esclarecido de duas meninas; os segredos que cada personagem, e a cidade como um todo, parecem guardar; os mistérios envolvendo o passado da protagonista, Jack; e as formas assustadoras de intimidação que ela vem sofrendo desde que chegou à cidade. Parece muito? Sim, também achei, mas apesar de uma pontinha ou outra, a autora conseguiu juntar tudo e dar explicações satisfatórias no final.
Os personagens são perfeitamente bem construídos. Todos, sem exceção, têm envolvimento na história, sabem de tudo e mais um pouco, e confundem facilmente os leitores. Isso vale também para a protagonista, Jack, que traz os segredos mais interessantes e paira, ao final, como uma heroína do avesso com suas motivações ficando a cargo do julgamento pessoal de cada leitor. E a trama sustenta mistérios e mortes o suficiente para embaralhar qualquer fã de thrillers. Definitivamente, nada é o que parece nesse livro.
C.J. Tudor vem crescendo em qualidade nas histórias que apresenta e mostrando uma versatilidade incrível. Seus livros passeiam pelos mais diversos temas e estilos, mantendo o pezinho no suspense/terror, mas sem se ater exclusivamente a isso.
Garotas em Chamas é um excelente suspense, com muitas reviravoltas, inúmeros mistérios e um resultado geral que não vai decepcionar os leitores.