Thalyta Vidal 08/01/2023
Doramar ou a Odisseia, Itamar Vieira Júnior
Talvez pelo sucesso de "Torto Arado", entremos em "Doramar ou a Odisseia" esperando um pouco mais das narrativas aqui apresentadas. Comum aos muitos contos de produção contemporânea, alguns dos que são apresentados nesse conjunto deixam o final a cargo do leitor -aqui meditamos sobre o que nos foi contado-, trazem um desfecho sem brilhantismo, o que aspira o real. Defino dentro dessa reunião de pequenas narrativas três histórias que merecem grande destaque: 1. Alma; 2. Nas profundezas do lago; 3. Voltar. É incrível como Itamar consegue trazer o sentimento/sofrimento/abandono por meio da voz feminina, a maioria dos contos é protagonizado por mulheres. Aqui vi ecoar as vozes de Conceição Evaristo ao afirmar: A nossa escrevivência não pode ser lida como história de ninar os da casa grande, mas para acordá-los dos seus sonos injustos. Essa voz ecoa fortemente no conto "Alma". Embora homem, o autor consegue revelar a dor de mulheres negras, de mulheres marginais, de mulheres subalternas. Também ouvi a aflição de Bertoleza, de Aluízio de Azevedo, na voz da protagonista de "Alma", pois, a morte se apresenta como liberdade para aqueles que foram escravizados. Outro ponto que salta ao leitor é a marca de um autor pesquisador, é latente o conhecimento que Itamar Vieira Júnior incorpora à sua obra sobre condições histórico-geográficas do país, a exemplo das palavras em língua indígena usadas em um dos contos (me lembrou bastante a forma como Chimamanda introduz falares de diferentes línguas africanas às suas narrativas). Como esperado desse escritor, o livro é sobre Doramar. Dor. Amar. É sobre presenças e ausências, sobre sofrimentos marginais, levando o pesquisador ao rol daqueles que, na produção brasileira contemporânea, têm utilizado a ficção literária como forma de reflexão sobre a subalternização e silenciamentos de grupos ao longo da história. Uma leitura necessária e mais uma grande obra de I.V.J.