Nah 17/11/2021
NECESSÁRIO E IMPACTANTE
O mimo da caixinha de novembro da TAG Inéditos foi um livro com textos de 6 autores. Falando sobre "ideologia literária da cor" e suas experiências enquanto escritores negres, o pequeno livro de apenas 145 páginas tem uma grandeza literária de extrema importância.
AS CORES DA FÉ, por Luiz Maurício Azevedo
Num texto introdutório, o doutor em Teoria e História Literária pela Unicamp fala sobre como a literatura produzida por pessoas negras é vista no Brasil.
?No Brasil, há uma ideologia literária da cor, que incide sobre aquilo que consideramos boa ficção. Não é à toa que nosso cânone é esmagadoramente eurodescendente. Estudamos autores brancos porque são brancos, mas estudamos autores negros somente quando eles se mostram bons, apesar de serem negros.?
?Não foi difícil, para o país da democracia racial, dissolver na água as raízes negras das obras de Mário de Andrade e apagar Maria Firmina dos Reis de nosso mapa literário.?
AFRO-CUBANA: identidade e memória através da escrita, por Teresa Cárdena Ângulo
A escritora e assistente social relembra seu fascínio por livros desde a infância e como a paixão pela literatura e a necessidade de se ver representada fez com que ela adentrasse os caminhos da escrita.
?Somos de origem muito humilde. Nasci em Cárdenas, município de Matanzas, uma das províncias cubanas onde houve a maior população de pessoas escravizadas. Essa área também foi o berço de frequentes levantes. Os africanos se avisavam mutuamente através do toque de tambores que haveria uma revolta e que fugiriam para as montanhas. Matanzas é a terra onde viveu Fermina Lucumí, a africana que liderou um levante contra os brancos senhores de engenhos e entrou para a história como a primeira mulher fuzilada pelo regime colonial em Cuba, e também Carlota, a quilombola que foi capitã de palenque e que esquartejaram em 1843 como punição por sua bravura. Viemos de uma província verdadeiramente corajosa, cheia de histórias de grande valentia, berço de rebeldes aborígenes e quilombolas africanos. Minha família tinha poucos recursos, era muito pobre, mas herdou toda aquela força e vontade de sobreviver apesar das dificuldades.?
?Onde estavam as garotas negras, aquelas que se pareciam comigo? Como leitora, nunca as encontrei. Nas páginas dos livros, os personagens enrubesciam, seus cabelos flutuavam com a brisa, seus olhos azuis ou verdes reproduziam a cor do mar e do céu. Mas meu rosto preto, meu cabelo crespo, meus lábios carnudos estavam totalmente ausentes. Então soube para onde devia me encaminhar. Tudo o que vivia, minha própria dor por sofrer racismo.?
?Tínhamos pouca ou quase nenhuma representatividade. Onde estavam as famílias humildes, como a minha? Onde estavam a infância e a juventude negra? Onde estão tantos heróis e heroínas da história cubana que deram a vida pela liberdade??
FILSAN, por Nadifa Mohamed
No conto escrito pela autora do livro do mês da TAG Inéditos, acompanhamos a jovem militar somali Filsan e sua experiência ao ser enviada para uma difícil e perigosa missão.
AS CONFISSÕES DE UM ROMANCISTA NEGRO, por Jeferson Tenório
Nesse texto, o autor de O Avesso da Pele tenta responder à pergunta ?o que afinal um romancista negro que?? e para isso retoma à origem de sua experiência como escritor.
??O que quer um homem negro??. Fanon responde a essa pergunta ao longo de sua obra: um homem negro que, no fim das contas, um reconhecimento de humanidade.?
?Sobreviver era nossa prioridade. Nesse tempo, os livros não tinham chance com a gente. A vida era mais urgente que a ficção.?
?Olhando para trás, talvez eu consiga responder com mais segurança o que afinal um romancista negro quer: um romancista negro que é ser lido como literatura.?
ARTE E ESTÉTICA NEGRA: uma conversa entre Allan da Rosa e Marcelo D?Salete
Conversa interessantíssima entre os dois escritores sobre diversos assuntos, como literatura, MPB, revoluções e religião.
COMO ME TORNEI ESCRITORA, por Cidinha da Silva
A escritora e editora relembra sua trajetória pelo universo artístico até se tornar escritora.
?Desse lugar de onde o irmão angolano veio hoje, eu vim ontem, e lá, antes de nos separarem, nós dois bebemos da mesma fonte encantada que nos deu super-poderes para produzir infinitos e sobreviver à opressão de cabeça erguida. De lá vem o meu humor.?
Achei pertinente destacar alguns trechos da obra, que eu sublinhei a lápis de cor roxo no meu exemplar - nada que eu falasse a respeito dos textos conseguiria exprimir a grandeza dos mesmos.
Um livro extremamente importante, com textos impactantes e emocionantes.