:: Sofia 25/11/2021Romance de época? Acho que não.Eu sou uma nova amante do gênero romance de época. Mas fato é, que romances de época todos têm o mesmo tom, a mesma urgência e são similares entre si (longe de mim reclamar! Continuo consumindo avidamente). Por isso, numa procura em blogs, encontrei uma recomendação acerca de O Tempo Entre Costuras, que dizia se passar 1930-1940, na Península Ibérica.
Resolvi dar uma chance a essa variação. Afinal de contas, além de sair da região da Inglaterra-Escócia, a história se passa num período palpável a nós leitores (para mim é a época da minha bisavó), numa Europa efervescente, muito mais liberal do que o século XVIII. Queria ver o tom que a narrativa teria, seria a mocinha uma mulher indefesa? O mocinho seria um cavaleiro?
Bem, eu estava redondamente enganada em meus "pré-conceitos". A personagem principal é Sira Quiroga, uma costureira de origem simples, noiva de um homem simples, Ignácio, com ambições simples na vida. Ignácio é o mocinho da história? Nããão! A história da personagem dá uma reviravolta quando conhece Ramiro, um sedutor que dá para Sira o que ela nunca poderia imaginar: luxo e luxúria, uma paixão sem proporções. É Ramiro o mocinho, então? Também nããão! Por aí podemos perceber já uma grande diferença dessa protagonista com outras do romance de época. Sira não é "boazinha", ela falha com o amor puro de Ignácio e os leitores conseguem perceber que Ramiro é um canalha. A passagem de Ramiro pela história não dura muito, mas as consequências de seus atos sim: ele deixa em Marrocos uma Sira doente, de amor e de saúde, com suas dívidas para pagar.
Assim, o livro de María Dueñas já passava longe do que eu esperava de um romance de época. Mas tem mais: Sira passa por imensas dificuldades e não há mocinho no enredo da história. Apenas homens com outros problemas que não os seus; a relação amorosa não é a parte principal da trama. As dificuldades da Srta. Quiroga nos permitem uma real identificação com ela, nos dando satisfação de vê-la crescer ao longo da década de 30. Outro diferencial do livro é o vaivém de personagens secundárias, tão distintas em classe, dinheiro, personalidade e influência na vida de Sira, que estão afundados em seus próprios problemas. Assim, vemos num livro de ficção uma dura verdade que aprendemos na vida: somos protagonistas apenas da nossa história; cada pessoa tem a sua própria.
Para mais, O Tempo Entre Costuras é um livro muito bem escrito, é uma Sira do futuro, mais velha e vivida, que nos conta a história. Algumas vezes temos pinceladas de seu amadurecimento na narração, outras ficamos com angústia por vermos a mulher endurecida que se forma a frente de nossos olhos, fruto das dificuldades pessoais e da guerra. Ah! Essa é, na minha opinião, a maior distinção do livro: uma história que não ignora a História do mundo, política e factualmente. Na verdade, Sira é uma personagem que, de uma hora para a outra, se vê metida em meio a personagens históricos internacionais, da Guerra Civil Espanhola e da Segunda Guerra Mundial.
Portanto, eu, que comprei essa preciosidade acreditando que morreria de amores por um casal, me encontrei morrendo de amores por uma personagem cheia de erros acumulados, que segue crescendo nas adversidades. Esse livro se tornou, já, um favorito meu. Uma passagem, que achei bacana, na página 202: "Mas errei, como quase sempre se erra quando construímos concepções com base no frágil apoio de uma simples ação ou algumas palavras".