Lê Golz 17/06/2016Apaixonante!O que esperar de um romance histórico escrito por Charlotte Brontë? Depois de ler Jane Eyre, uma das principais obras da autora, minha ansiedade para ler todos os seus livros era grande. Shirley, essa publicação linda da Pedrazul Editora veio em boa hora e mesmo tendo muitas diferenças com a primeira obra que li da autora, ainda assim conseguiu me surpreender.
Apesar do título, a obra conta as histórias de Miss Shirley Keeldar e Miss Caroline Helstone, duas mulheres completamente distintas no comportamento e personalidade. Shirley é uma jovem herdeira de uma grande fortuna, sendo cortejada por vários homens que lhe propuseram casamento. Shirley além de muita bela, é ousada, vibrante, orgulhosa e guarda um segredo. Caroline, por sua vez, é o oposto, órfã, não tem fortuna, vive opressivamente em uma casa paroquial com seu tio, e além de muita bela também, é mais doce, recatada e vive um amor platônico por seu primo Mr. Robert Moore. Essas diferenças, portanto, não poderia impedir que elas fossem amigas.
Narrado em terceira pessoa, o livro é ambientado na Inglaterra industrializada do século XIX, no período da guerra Napoleônica, onde inúmeros operários estavam desempregados, as colheitas não iam bem e as primeiras fábricas do século, cujas mãos de obra estavam sendo substituídas pelas máquinas, estavam sendo implantadas. Nesse cenário, os primeiros capítulos se iniciam com a luta de Mr. Moore para manter sua fábrica e seus negócios estabilizados, portanto, nesses trechos a leitura pode ser mais lenta, até que enfim nossas protagonistas apareçam.
Brontë tem uma escrita extremamente rica e muito clara apesar da época que escreveu esse romance. É fácil envolver-se com suas histórias e sermos totalmente cativados por seus personagens. São tantos os detalhes, que é como se estivéssemos próximos observando as cenas e não apenas lendo. Devo ressaltar que esses detalhes não tornam a leitura maçante, apesar de ser certo dizer que alguns trechos são realmente mais lentos, mas a forma que a autora narra só enriquece ainda mais a obra. Quem gosta de clássicos sabe o que estou falando.
"Esse olhar não quis ele conceder-me. É estranho que a dor quase me sufoque pelo olhar de um ser humano não ter encontrado o meu." (123)
O que diferencia essa obra de Jane Eyre, por exemplo, é o drama e melancolia quase inexistentes em Shirley. Uma característica dos livros da autora que se mantém aqui é a crítica social nas entrelinhas. A personagem Shirley possui muito dos predicados de um homem, e além disso, é muito rica e por esse motivo poderia dar sua opinião quando bem entendesse e tomar suas próprias decisões. Afinal, em uma sociedade hipócrita do século XIX (infelizmente até hoje), que homem contestaria uma jovem bela, solteira e rica? Por outro lado, Caroline representa toda a opressão que as mulheres viviam naquele século, e sua vida resumia-se na casa sacerdotal em que morava.
Somado a impecável escrita, ótima construção dos personagens e as construtivas críticas sociais, Brontë surpreende ainda mais com o suspense ao longo do enredo. Há um mistério no desaparecimento da mãe de Caroline, que será revelado em determinado trecho do livro. Shirley também guarda um segredo que apesar de já se tornar visível perto do final, ainda surpreendeu quando li os últimos capítulos. Durante quase todo o livro não pude deixar de ficar aflita com o destino de Caroline e seu amor proibido. A autora conduziu esse sentimento dela de uma forma dolorosa e que irá levantar várias dúvidas ao leitor sobre seu final feliz. Os mistérios por trás dos verdadeiros sentimentos dos personagens foi o ponto forte do livro, e que o tornou todo especial.
Como não poderia deixar de destacar, a Editora está de parabéns pois a obra é lindíssima. Primeiramente pela capa e contracapa perfeita. A obra é recheada de ilustrações dos personagens e consegui visualizá-los exatamente daquela forma - esses desenhos enriqueceram muito a obra. As folhas amareladas, fonte em tamanho ideal e revisão impecável também contribuíram para um boa leitura.
"Provavelmente já disse isso: o amor pode desculpar qualquer coisa, exceto a maldade, pois a maldade mata o amor." (p. 95)
Simplesmente amei o livro e recomendo de olhos fechados, ainda mais se você é um leitor ávido por romances históricos como esse. Não espere contudo, momentos de puro romance, drama e melancolia. Teremos sim, momentos de romances para suspirar, mas esses serão muito poucos. O livro vale a pena por sua carga histórica, crítica social e um toque de romance. Sem contar que Charlotte Brontë é uma autora admirável. Estou mais uma vez apaixonada por um de seus romances. Então, se você ama clássicos, não se arrependerá de ler Shirley.
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