spoiler visualizarJeison 14/07/2011
O Colecionador
Quanto mais eu penso sobre esse livro, mais eu gosto dele. É um desses livros que depois de lido, precisa ser digerido. É triste, denso, mórbido, com uma gama tão variada de sentimentos e sentimentos tão complexos e confusos, tão humanos, que é preciso de certo tempo para assimilar tudo. As semelhanças imediatas que vem a minha mente são com Madame Bovary e O Perfume (já até vi comparações entre esse e o colecionador em outras resenhas). A semelhança que eu digo pouco tem a ver com as histórias ou os enredos desses livros. Na verdade, são três livros que não nos transportam para mundos mágicos, não nos tiram da nossa realidade para uma realidade melhor, eles nos levam para uma realidade PIOR, nos fazem enxergar o mundo de outros pontos de vista. Não são um passeio no parque, e nem querem ser! São um charco, na verdade. E são muito bons, por que a literatura não tem a obrigação de ser um mar de rosas, nunca!
Frederick Clegg é um funcionário público colecionador de borboletas, que alimenta por Miranda, uma jovem que mal sabe de sua existência, um amor platônico. Quando Frederick ganha uma bolada apostando em futebol, ele vê a oportunidade de agregar Miranda à sua coleção. Sinceramente, um personagem incrivelmente bem construído, que foge bastante do padrão serial killer. Não é completamente bizarro e maluco, com um passado cheio de traumas e abusos que em geral, se não justifica, pelo menos é a causa da loucura que leva aos crimes. Não é um personagem que se admire ou que possa divertir como o Dr. Lecter, mas também não é um completo biruta a ponto de se vestir como a mãe. É um personagem aparentemente comum, como seu vizinho é comum, como o leiteiro é comum, um personagem que você bem poderia cruzar na rua e simplesmente não perceber, que se não fosse por um simples jogo de azar, e portanto um mero acaso, jamais teria tido a oportunidade de seqüestrar Miranda e teria então seguido na sua vida relativamente normal. E é exatamente nisso que está todo o horror que o personagem desperta. Quantas pessoas, ou quais pessoas, se lhes fosse oferecida a oportunidade, fariam algo do tipo?
Sobre Miranda: na verdade é muito difícil falar sobre ela. Na primeira parte do livro que é narrada por Caliban (como Miranda chamava Frederick) Miranda nada mais é que a descrição de uma borboleta vista pelos olhos do colecionador. E de repente, na segunda parte, você vê a borboleta com seus próprios olhos e ela é ainda mais bonita que a descrição. O colecionador a descreve e vê linda e idealizada, mas você a vê real e imperfeita e as imperfeições a tornam ainda mais bonita. Na segunda parte você acompanha toda a angústia, medo, raiva e evolução da personagem, você descobre sobre a vida antes do cárcere, conhece seus sonhos, cria um vínculo mesmo com ela. Essa parte é interessante, pois diferente de seriados e filmes policiais, que eu assisto muito, diga-se de passagem, a vítima é muito mais que um corpo, e você não a conhece apenas pela visão dos outros, você a conhece por ela mesma! A vontade de viver, a determinação, a confiança, a fé de Miranda são simplesmente comoventes. No final do livro chega-se com uma expectativa gigante sobre qual será o futuro dessa borboleta. [SE VOCÊ NÂO LEU E NÃO QUER SABER O FINAL, NÃO PROSSIGA]. John Fowles não teve piedade com o final do livro, Miranda morre e percebemos como é incrivelmente brutal quando uma vida é arrancada, como é brutal interromper uma vida que seguia seu rumo. Realmente muito triste o fim. O gosto que fica ao se fechar o livro é bem amargo.
Mas, é como eu disse, não é um livro agradável, porém é muito bom e vale muito a pena ser lido!