spoiler visualizarPaulo 17/12/2019
"Consumir-se uma pessoa a vida inteira sem saber pra quê!"
Para mim, este livro é um ótimo exemplo do seguinte: se não gostamos de um livro, é porque talvez não estamos preparados para ele... ainda. Pois anos atrás comecei a ler S. Bernardo e achei terrivelmente chato; tentei Caetés, que está neste mesmo livro, e dei a mesma opinião. Já anteontem, quando comecei a ler S. Bernardo, me senti preso pela história desde o começo. É como se durante os meses de leitura eu aprendi a imaginar melhor a cena e a observar melhor o comportamento dos personagens. Assim, eu sinto a leitura menos chata ou nada chata, e, em vez disso, prazerosa. E agora darei também uma nova chance a Caetés.
Gostei demais da história de S. Bernardo. O narrador-personagem Paulo Honório busca refúgio na escrita ao ver que tudo aquilo pelo que ele lutou durante a vida não serviu de muita coisa - vide o título da minha resenha -, e o que poderia servir ele destriu com seu egoísmo e ciúme: "Digo em voz baixa: Estraguei a minha vida, estraguei-a estupidamente (cap. 36). Assim, aquilo que Paulo conquistou durante sua vida, até mesmo a propriedade, o restabelecimento de suas fronteiras etc, tudo isso parecia já irrelevante quando ele viu que tudo passou, quando ele se viu sozinho em sua casa, matutando a melhor forma de escrever seu livro - e descobriu que a melhor forma é escrever sozinho, já que a criação em conjunto deu errado.
Nem mesmo seu conhecimento do mundo parecia relevante no fim. Antes sua fonte de conhecimento era motivo do seu orgulho, tudo o que ele aprendera foi no mundo, e que a escola normal seria inutilidades. No fim "[...] devo confessar que a superioridade que me envaidece é bem mesquinha. Além disso estou certo de que a escrituração mercantil, os manuais de agricultura e pecuária, que forneciam a essência de minha instrução, não me tornaram melhor que o que eu era quando arrastava a peroba" (cap. 36).
Em suma, o arrependimento o incomoda e a infelicidade o consome, "se eu povoasse os currais, teria boas safras, depositaria dinheiro nos bancos, compraria mais terras e construiria novos currais. Para quê? Nada disso me traria satisfação" (cap. 36).
E outra coisa, me agradou muito o estilo "direto ao ponto" do autor. E as palavras regionais são muitas, mas, para quem também não é do nordeste, pode se entender algumas palavras pelo contexto e a leitura não fica comprometida - muito pelo contrário, se enriquece.