Laís 17/03/2021
Os Mortos se divertem (?)
É 11 de Dezembro do ano de 1963. Enquanto a cidade de Antares para ante uma greve geral, 7 mortos levantam-se de seus esquifes insepultos, instalando uma atmosfera de horror na população para um acerto de contas sem precedentes.
Incidente em Antares foi o último romance escrito por Érico Veríssimo, publicado no auge da Ditadura Militar, traz em seu cerne uma crítica à política brasileira e seu modus operandi, o romance classificado como Realismo Mágico/ Fantástico, é dividido em duas partes, a primeira trata de ambientar o leitor à fictícia cidade de Antares, localizada no Rio Grande do Sul, às margens do Rio Uruguai, na fronteira com a Argentina, e também passeia pelo cenário político brasileiro por mais de 70 anos, passando pelos governos de Getúlio Vargas, Juscelino kubitschek, Jânio Quadros, Jango Goulart, e outros. O primeiro que é natural de São Borja - no livro, uma cidade “vizinha” a Antares - chegou a visitar o município com nome de estrela e foi figura central dentro de acontecimentos importantes para a trama, é justamente esse cenário que me fez considerar essa primeira parte de Incidente em Antares como um romance histórico, é uma leitura perfeita para se aprender sobre a política brasileira e o período do coronelismo através da literatura.
A cidade com nome de estrela é palco de acontecimentos surreais ao passo que seus personagens são os mais reais possíveis, refletem as idiossincrasias do homem comum. A busca irrefreável por dinheiro e poder é ilustrada através do antagonismo das famílias mais tradicionais, as “donas da cidade”, os Vacarianos e os Campolargos, simbolizando também a polarização política, se de um lado temos a família Vacariano, que é conservadora, do outro temos os progressistas Campolargos, enfatizando que a disputa das famílias não é só por terras e poder mas por razão política. Outros tipos como o prefeito corrupto, o delegado que abusa do poder, os médicos que encobrem os crimes dos poderosos, o coronel para quem a lei se molda a seus desígnios, assim como os problemas sociais que refletem as mazelas que poderia ser de qualquer cidade do país dão a Antares o realismo que Veríssimo traz com maestria.
Não obstante o enredo com forte teor dramático do livro (7 mortos andando pela cidade em inegável estado de decomposição, atraindo ratos e urubus e espalhando o odor da morte), que cabe dizer, virou série na telinha da Globo, dei boas risadas lendo Incidente em Antares, Érico trás através do humor irônico uma forte simbologia cristalizada nos seus mortos-vivos, personificando a podridão que existe no ser humano em todas as esferas e mostrando que a morte faz todos iguais, independente do status social. Essa leitura marca, por assim dizer, meu retorno à Literatura brasileira, que deixei de lado por um bom tempo e embora a primeira parte do livro em algum momento tenha se tornado enfadonha pelo grande teor político, foi muito importante lembrar das aulas de História do Brasil e ver que de alguma forma e isso eu digo com a maior dor na alma, não mudou muito desde então.