Paula 25/11/2013Encantador.Estou revisitando alguns livros de minha estante sobre os quais, não sei porque motivo, deixei de registrar minhas impressões. Hoje decidi então escrever sobre um livro que me é muito querido: A Elegância do Ouriço, da escritora francesa Muriel Barbery. Lembro que fiquei sabendo desse romance logo que ele foi lançado pela Companhia das Letras, em 2008, quando meu pai me mostrou um comentário na revista Carta Capital falando sobre o livro e me disse que ele tinha tudo a ver comigo pela descrição. Uma personagem que é a zeladora de um prédio muito chic em Paris e que esconde um segredo: uma paixão pela arte e pela literatura. E logo que ele terminou de me dizer isso eu já estava na livraria comprando o livro. E ele tinha toda razão, porque me apaixonei pela história. Depois disso, acho que já comprei duas ou três edições que acabaram virando presente para pessoas queridas, que depois de uma conversa gostosa sobre a história ficaram com muita vontade de ler também. E hoje procurando o livro me dei conta de que não tenho mais a edição em português. Nesses momentos, ter mais de uma edição de um livro favorito, ainda que em outro idioma, não tem preço. (tudo culpa dessa mania de ser precavida, viu, gente? Precaução: motivo maior de se ter mais de uma edição do mesmo livro) =]
Toda a história se passa em um prédio luxuoso de Paris. As pessoas que moram lá são bem esnobes, a alta burguesia que precisa realmente esbanjar tudo o que tem, sendo que na verdade sabe muito pouco ou quase nada sobre o que tem. Entre os moradores do prédio, uma família se destaca: a família Josse. O pai de Paloma é um político muito influente; a mãe é uma super dondoca que durante todo o livro dará demonstrações claras do quanto é vazia; a irmã de Paloma, que segue o mesmo caminho da mãe e com quem Paloma não tem nenhuma afinidade. E por fim, Paloma, uma menina de 11 anos, brilhante e extremamente inteligente, além de muito sensível. Na verdade, ela é a pessoa mais lúcida dessa família onde as relações são muito superficiais. Paloma sofre com isso, por não sentir que pertence a esse meio em que se encontra, e planeja se suicidar no seu próximo aniversário, tamanha é a sua solidão. É lendo o diário de Paloma que vamos compreendendo esse universo e o que se passa pela cabeça dessa personagem que imediatamente nos cativa. Dá vontade de adotar Paloma como filha.
A outra personagem principal é a zeladora Renne, uma mulher discreta, calada, meio sisuda, sobre a qual ninguém sabe nada. E é aqui que talvez esteja a grande crítica da Muriel Barbery: será que a Renne realmente esconde um segredo ou será que ela é invisível pela condição social que ocupa entre os habitantes desse prédio? Os moradores entram e saem sem lhe dirigir o olhar. Muitos deles nem sabem o nome da zeladora, que segue cuidando e mantendo a rotina do prédio em funcionamento e, ao final do dia, encontra no seu quarto um pequeno refúgio, espaço para seu gato e para os muitos livros que devora. Renné é uma leitora voraz, uma mulher extremamente culta, mas que não fica esnobando esse conhecimento todo para os outros. E é isso o que eu mais gosto nessa personagem. Renne tem um conhecimento vasto sobre os clássicos da literatura mundial, que acumula em cada canto disponível do seu quarto; sabe muito sobre teatro, sobre ópera, sobre música clássica. Paloma, essa menina inteligente, mas que anda cultivando pensamentos mórbidos, é a única moradora do prédio que consegue de fato “ver” Renne. E Renne, por sua vez, sendo igualmente sensível diante do universo que habita, consegue ver que Paloma está sofrendo, pois entende como ela se sente. As duas, através do amor à literatura e à arte, desenvolverão uma amizade bonita e redentora. Por conta de Renne, os planos de Paloma talvez mudem. E com Paloma, talvez Renne se faça notar, sem esconder o que de belo tem na alma.
Enquanto essa amizade se desenvolve, é o gato de Renne que vai mudar todo o destino da história. Um novo morador chega ao prédio, um japonês muito educado chamado Kakuro Ozu, e notando o nome do gato de Renne percebe imediatamente que ela não é tão comum quanto o que os outros moradores pensam. Ele também tem olhos que conseguem ver as pessoas como elas são e o muito que elas podem trazer para nossas vidas.
A Elegância do Ouriço não é só um livro sobre amizade. É um livro sobre a vida, sobre a importância do conhecimento (mas do conhecimento que se compartilha e que nos enriquece, sem esnobismos), uma reflexão bonita e, em alguns momentos, até filosófica sobre o ser humano (acredito que por conta da formação da autora em filosofia) através de personagens extremamente complexos.
Hoje fiquei com muita vontade de reler essa história (já estou com minha edição em inglês em mãos) e isso já é o suficiente para dizer o quanto esse livro é especial. São poucos os livros que podemos revisitar. Só aqueles dos quais sentimos saudades. Não posso deixar de recomendar também o filme que é igualmente lindo e tem cenas muito engraçadas: A Elegância do Ouriço (Mona Achache, Le Hérrison, 2009.
Muriel Barbery. A elegância do ouriço. São Paulo: Companhia das Letras, 2008. 352 páginas. Tradução: Rosa Freire D'Aguiar
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http://pipanaosabevoar.blogspot.com.br/2013/10/a-elegancia-do-ourico.html