Alê | @alexandrejjr 20/07/2021
Os cadeados invisíveis
A privação da liberdade é uma punição infernal e exclusivamente humana. Negar a alguém um direito que nasce conosco é a forma mais desumana que os homens encontraram para criar seu próprio purgatório.
Em "Carcereiros", segundo livro da trilogia do cárcere de Drauzio Varella, os leitores conhecem outro tipo de prisão. Conhecem uma prisão simbólica, trancada por cadeados invisíveis.
Os carcereiros das prisões brasileiras são funcionários públicos do baixíssimo escalão. Diferentemente dos engravatados do sistema judiciário, esses homens carregam a difícil missão de vigiar e controlar assaltantes, assassinos, traficantes e estupradores por salários módicos, alimentados pela necessidade, atormentados pelo medo. São eles que precisam ter, todos os dias, a temperança necessária para lidar com os párias sociais que todos nós preferimos esquecer. E depois desse desafio, tentar voltar à mundana rotina de suas casas.
O que Drauzio tenta fazer aqui é mostrar um pouco da coragem desses homens através das histórias coletadas ao longo dos encontros com esses profissionais, que ele tem orgulho em chamar de amigos. Homens simples, imperfeitos e demasiadamente humanos, mesmo convivendo tanto tempo com as piores cenas que a violência pode proporcionar. Homens que precisam de mais de um trabalho para não cair na desgraça da corrupção que infesta desde sempre as cadeias, sendo esse apenas um reflexo da própria sociedade. Homens que não negam os atos moralmente questionáveis que cometeram, afinal, não eram exatamente escolhas. São histórias que precisavam ser compartilhadas. E sorte nossa que foram pelas mãos de Drauzio, um humanista brasileiro como poucos que merecem tal reconhecimento.
A leitura de "Carcereiros", além de obviamente ser um contraponto à "Estação Carandiru", traz mais do homem e um pouco menos do médico no texto. Aqui temos um Drauzio Varella questionador e muito mais reflexivo e pessoal que no primeiro livro, um ponto interessantíssimo para os leitores.
Leia Drauzio. Leia sobre a desumanidade de estar e conviver com o cárcere. Mas não espere respostas, nem as simples e muito menos as complexas. Como todo bom livro, ele vai entregar perguntas. E isso basta.