_ijaqline 03/05/2024
E ninguém é eu. Ninguém é você. Esta é a solidão.
"Tenho medo então de mim que sei pintar o horror, eu, bicho de cavernas ecoantes que sou, e sufoco porque sou palavra e também o seu eco.
Eu, viva e tremeluzente como os instantes, acendo-me e me apago, acendo e apago, acendo e apago. Só que aquilo que capto em mim tem, quando está sendo agora transposto em escrita, o desespero das palavras ocuparem mais instantes que um relance de olhar. Mais que um instante, quero o seu fluxo.
Venho do longe ? de uma pesada ancestralidade. Eu que venho da dor de viver. E não a quero mais. Quero a vibração do alegre. Quero a isenção de Mozart. Mas quero também a inconsequência. Liberdade? é o meu último refúgio, forcei-me à liberdade e aguento-a não como um dom mas com heroísmo: sou heroicamente livre.
Eu que quero a coisa mais primeira porque é fonte de geração ? eu que ambiciono beber água na nascente da fonte ? eu que sou tudo isso, devo por sina e trágico destino só conhecer e experimentar os ecos de mim, porque não capto o mim propriamente dito."
Tristeza, confusão, questionamento, admiração, identificação...Montanha-russa de sentimentos, como em qualquer outra obra dessa mulher. Os livros de Clarice não são feitos para serem compreendidos ou explicados, mas sim para serem sentidos. Profundamente.
Ler Clarice é ver meu próprio reflexo. É conseguir finalmente encontrar formas e palavras para coisas que eu nunca conseguiria transcrever, mas que sinto intensamente em cada escrita dela.
"Eu, que nunca sou adequada."