PorEssasPáginas 26/05/2014
Resenha: O Teste - Por Essas Páginas
Desde o começo da nossa parceria com a Única, ainda não tinha lido nenhum livro da editora, apenas a Lany e a Lucy leram. Simplesmente não tinha me interessado pelos títulos. Foi então que apareceu O Teste, de Joelle Charbonneau; eu ainda fiquei com uma certa dúvida se deveria ou não ler, afinal, é uma distopia, e vamos combinar: o mercado está saturado deles. Mas a Lany pediu o livro pra mim, ele chegou na sexta-feira passada, olhei pra ele, ele olhou pra mim, rolou um sentimento e eu comecei a ler. E, apenas dois dias depois, estou aqui, escrevendo sobre ele, surtando e agradecendo à Editora Única por ter trazido esse título porque, gente, o livro é simplesmente SENSACIONAL! Eu diria um palavrão para descrever meu sentimento, mas sou muito phyna, portanto, vou respirar fundo e começar essa resenha… ai, que delícia devorar um livro e surtar com ele! Que maravilha!
O Teste começa de um jeito não muito diferente de qualquer distopia adolescente por aí. Malencia Vale ou melhor, Cia (nome muito estranho, ok, mas você acaba se acostumando, mesmo porque a personagem é IN-CRÍ-VEL e dane-se o nome esquisito dela), é uma garota de 16 anos, super estudiosa, que sonha em se tornar adulta e passar no Teste. Isso pode parecer infantil, mas realmente é assim que Cia parece no início (mas calma, isso faz parte da graça do livro!): no dia de sua formatura, ela fica toda feliz por simplesmente estar usando um vestido vermelho – e não rosa – pois isso significava que ela estava virando adulta. No dia seguinte, ela não mais voltaria à escola; no mínimo, ela teria que arrumar um trabalho – e sua mãe a pressiona bastante para isso, diferente do pai, que parece mais cauteloso quanto ao futuro da filha. No entanto, o que ela realmente quer é estar apta a fazer o Teste.
“Ela me diz que tem orgulho de mim. Faço o melhor para não me prender a ela quando nos abraçamos em despedida. De repente, eu lamento todas as vezes que fiquei brava por ela não encorajar meus sonhos na universidade. Agora entendo por que ela teve medo de que eu tivesse sucesso. Agora é tarde demais.” Página 45.
Esse Teste é como a porta de entrada para a universidade, onde só os melhores, os mais inteligentes e os capazes de serem líderes entram. Aí você pensa: ok, isso é o quê, um vestibular? Não, meus amigos, é muito, muito mais tenso que uma mera prova de conhecimentos gerais. Já faz dez anos que alguém da colônia que Cia vive foi selecionado para o Teste. A colônia é pequena, e os boatos que correm é que talvez seja provinciana e mente fechada demais para gerar líderes inteligentes para a capital Tosu City, o Teste e, por fim, a universidade. Mas o buraco é mais embaixo, pessoal. As intrigas e conspirações já começam aqui. O pai de Cia passou pelo Teste antes de vir para a colônia e, quando Cia recebe a notícia de que foi aceita… seu pai senta com ela e conta coisas terríveis. Sonhos, pesadelos horrorosos e o pior: sua memória foi apagada após o Teste. E alguns dos seus amigos desapareceram.
Só que agora Cia é obrigada a ir para o Teste. Não há escapatória. Ela segue para a capital, Tosu City, junto a três outros colegas da colônia. Ela não tem muita amizade com nenhum deles, mas agora eles são sua única conexão com sua casa, para a qual jamais retornará. E então o Teste começa. E aí as coisas começam a ficar sinistras.
Tudo isso que eu narrei para vocês é só a premissa do livro; a ambientação. É necessária, mas não é ainda a melhor parte. Fiz questão de dizer tudo isso para colocá-los a par da história; até aí, eu estava lendo de boa, estava interessante, mas nada de mais, nada fora do normal. A narração é fluida e bem construída, envolvente, dá vontade de continuar lendo. Mas então, eis que o Teste começa e tudo muda. Acontecem coisas realmente sombrias. E você começa a sentir que tudo e todos realmente estão em perigo. O Teste não é apenas uma prova de conhecimentos, é muito mais que isso; e a punição para erros é severa… digamos que “perder uma nota” não é nada por aqui. O livro vai, gradualmente, tornando-se mais denso, mais sinistro, até entrar em um momento de extrema tensão, na qual você não consegue mais parar de ler, você realmente precisa virar páginas e mais páginas, pois essa necessidade é quase física. Juro, não consegui largar o livro, eu tinha que chegar ao final.
“Tenho segredos também. Segredos que me fazem enfrentar o sono. E quando o sono me toma, aqueles segredos me perseguem em meus sonhos.” Página 237.
A evolução de Cia durante o livro é tão incrível que chega a ser desconcertante. Porém, ao mesmo tempo, é muito gradual, de um jeito que você nem consegue notar, como uma pessoa de verdade. A Cia que termina o livro é quase irreconhecível se comparada à que o iniciou. De uma garota apenas esperta, mas extremamente ingênua e cheia de sonhos, Cia evolui para uma jovem analítica, de pensamento ágil; o mundo opressivo em que percebe que se encontra a endurece, não a torna uma pessoa fria, mas sim prática e racional. Ela percebe que há coisas que simplesmente precisa fazer: não há outra alternativa. Ela ainda é humana e sofre, mas não faz drama, não fica de mimimi, não senhor; ela respira fundo, ergue a cabeça e segue em frente, aprendendo sempre um pouco mais e, principalmente, agindo. Ela é uma garota muito real, até comum, mas uma personagem forte no sentido de fazer o que tem que ser feito e não ficar remoendo as coisas, e o mais importante, ela não faz as coisas sem pensar. Isso a distanciou de muitas e muitas protagonistas por aí, especialmente das protagonistas de séries distópicas. Eu adorei especialmente o quanto Cia é prática. O livro tem sim questões adolescentes, mas Cia trata tudo de um jeito prático, racional, consciente. Não há enrolação, não há draminhas. Perfeito!
Até mesmo o romance foi na medida certa. Gradual, construído lentamente, imprevisível em alguns momentos. Essa última parte é especialmente interessante pois nem no alvo romântico de Cia você confia. Nesse livro, você realmente não confia em ninguém. Todos fazem o que for preciso para sobreviver, inclusive Cia! E eu nem vou dizer quem é o personagem com o qual Cia se envolve, porque o mais legal é que você demora um bom tempo pra perceber que será ele o par romântico dela. E, mesmo quando eles estão envolvidos, a relação é real e sem rasgação de seda amorosa, pois eles estão no meio de uma situação incrivelmente tensa e sabem que não é hora pra isso! Em meio a tantos livros que jogam na sua face um romancinho mela-cueca que desvia completamente o foco da distopia de verdade, um livro como esse é um oásis no deserto. E eu fui olhar: demorou quase 200 páginas para o casal se beijar. Aí sim, minha gente, nada de beijo nos primeiros capítulos, romance bem construído e que, até agora, eu ainda não sei se devo ou não torcer por ele, porque não confio no… vocês vão descobrir quem ele é! Há!
“O beijo é leve como uma pena, mas sinto até meu estômago.” Página 172.
A parte distópica da trama é sensacional. Você sente de verdade o medo, a opressão mascarada em sorrisos vazios, a conspiração, o sistema sinistro que lidera pessoas com mãos de ferro. Você tem a noção real de porque aquele sistema é horrível. E o final, ah, gente, o final é cruel. Ele soluciona várias perguntas, mas te deixa ao mesmo tempo sem muitas respostas. E o gancho final do livro para a continuação foi uma das coisas mais brilhantes que eu já vi; um gancho que me deixou na ponta da cadeira, mas não foi apelativo, fechou o livro, fechou uma história, mas mostra que sim, há muito mais a ser contado. E eu estou louca para ler.
A edição está competente, gostei bastante da capa – simples, mas direta, significativa -, da diagramação e dos detalhes nos inícios dos capítulos, os números sangrentos. No final, o marcador do livro vem na página da contracapa, podendo ser destacado, o que é brilhante! Porém, algumas folhas minhas vieram grudadas e, quando eu separei, elas rasgaram um pouquinho na ponta; pode ser um problema pontual desse exemplar, mas fica aqui o relato do que aconteceu. Além disso, a tradução pecou em muitos pontos, deixando a desejar com algumas escolhas equivocadas de palavras; a revisão também poderia muito bem ter cortado algumas repetições de palavras que às vezes irritam o leitor. O texto ficou com vícios de escrita e estilo que podem muito bem ser comuns na língua original, mas que em português ficam feios. Agora, tudo isso não é nada, absolutamente nada, em vista desse texto incrível e viciante de Joelle Charbonneau.
Não há limites para o quanto O Teste pode surpreendê-lo. Envolvente, maduro, sombrio, cheio de ação, um livro inteligentíssimo que vai fazê-lo pensar e desconfiar de todos. Estou morrendo aqui para ler as sequências. O Teste continua em Independent Study e Graduation Day, disponíveis apenas em inglês até o momento. Editora Única, pode trazer rapidinho pra gente esses livros? Tem uma pessoa surtando aqui por eles. Muito obrigada! Recomendo e muito que vocês leiam esse livro e também se surpreendam como eu. Só não me responsabilizo pelo estado em que ficarão após terminá-lo, já que, por aqui, eu estou à beira de um surto psicótico.
site: http://poressaspaginas.com/resenha-o-teste