Stefania.Dallas
06/06/2018Vamos ao impressões:
Escritor:
Em tempos conservadores, poucas vozes são ouvidas no meio de todo puritanismo e hipocrisia impregnada na sociedade. Na tentativa de passar a sua mensagem, escritores se arriscam a abordar temas polêmicos e mal vistos para poder abrir discussão na mente fechada da população. Em 1850, Nathaniel Hawthorne ousou retratar um tema condenado pela religião e por pessoas dominadas pela igreja: “o adultério”.
A escrita de Nathaniel é incisiva e não se preocupa em atenuar a sua crítica afiada contra a hipocrisia tanto da igreja quanto da sociedade que a segue cegamente. Tratando sobre o adultério e apontar personagens, como membros do governo e da igreja, mostrando o seu lado negativo e contraditório, fazendo com que a provocação do autor possa ser visível em vários pontos da obra.
Nos dias de hoje, o livro é considerado um dos maiores clássicos da história da literatura. O seu tema polêmico e a visão de Nathaniel sobre essa época puritana permanece atualíssimo. Além de permear de referências na cultura pop (o filme A Mentira, 2010, usa A Letra Escarlate como pano de fundo para fazer uma “recontagem” da obra), é um livro que serve de analogia para diversos tipos de julgamentos, e não apenas o adultério. Uma obra que consegue dialogar muito além do assunto que nos é apresentado.
Bem vamos ao resumão:
Naquela época até a mais simples e inocente forma de diversão já era considerada um motivo para prisão e penitência, imagine a situação em que a personagem principal se encontrava.
O romance começa logo depois do fato primordial que dá origem ao livro ter acontecido. Hester Prynne é libertada da prisão, com sua filha de três meses nos braços, Pearl, após ter sido encarcerada por adultério. Ela havia se mudado para Boston há cerca de dois anos e não vira sombra de seu marido durante esse tempo. O homem já havia sido dado como morto, mas de qualquer forma, apareceu grávida quando não deveria e “merecia” ser punida. Após ser humilhada publicamente diante de toda a cidade, no mesmo palanque onde criminosos eram açoitados e enforcados, Hester foi obrigada a usar para o resto de sua vida A letra escarlate bordada como aplique sobre suas vestes. Infelizmente a mulher era prendada, o A era graciosamente bordado com um fio dourado, que ela mesma confeccionou, então todo mundo achou que ela não tinha vergonha na cara mesmo. Qualquer tipo de adorno também era proibido na época… Pra piorar a situação se recusou terminantemente a revelar o pai da criança, mesmo após o reverendo Arthur Dimmesdale ter insistido publicamente, influenciado pelos magistrados.
Para piorar a situação, eis que chega no meio da multidão o homem que ela nunca mais imaginaria ver na vida. Ele a observa de longe, sem querer se envolver e ninguém na cidade o conhece. Naquela mesma noite o Dr. Roger Chillingworth foi chamado para cuidar da pequena Pearl que não estava passando bem. O médico então jurou à ex-mulher que acharia o safado, sem vergonha que era cúmplice dela naquele ato criminoso. Pois é…
Hester Prynne só pode ser descrita como uma mulher forte resignada. Ela aceitou todas as adversidades que estava destinada a sofrer por causa de seu pecado, como pessoa temente a Deus que era. Durante os sete anos nos quais se passam o livro ela foi espezinhada, evitada e mal falada por qualquer pessoa que passasse por ela. Conseguiu sustentar a filha por causa dos lindos bordados e costuras que fazia para as pessoas da cidade. E ainda fazia caridade sempre que podia, mesmo que recebesse maus tratos das mesmas pessoas a quem ajudava. Sua beleza foi sendo substituída gradualmente pela austeridade, apenas amostra visual do seu sofrimento.
A pequena Pearl… Para uma sociedade puritana como a que ela vivenciou, a menina simplesmente não era feita neste mundo. “A filha do pecado” era tida como cria do demônio, ou algo como uma fada. Criada à margem de todos, sendo maltratada assim como sua mãe, que era sua única companhia, ela não tinha mais para si além de sua imaginação. Inventava brincadeiras e amigos, se divertia e enjoava deles como a nenhuma outra criança era permitido. De certa forma, se não fosse pela solidão, poderia ser considerada a criança mais sortuda de todas por sua liberdade. Pearl é um espetáculo de inteligência miraculosa no meio de tanta gente obtusa.
O verdadeiro nome de Roger Chillingworth sequer foi revelado durante o livro (não que seja relevante, mas como sou curiosa...), o médico passou todos os anos seguintes àquele dia fatídico planejando se vingar do sujeito que o fez corno. E ainda fez a ex-mulher jurar que não contaria a ninguém quem ele era (eu também não iria querer…). Por um momento cheguei a sentir um pouco de pena dele, quando disse que a culpa também lhe cabia por sequer ter imaginado que uma mulher como Hester amaria um velho corcunda. Mas logo depois ele se tornou apenas amargo e chato, cujo único propósito na vida na verdade só o consumiu.
Já Arthur Dimmesdale é simplesmente um chato de galochas. Sabendo que esses quatro personagens que mencionei são os principais, creio que não preciso declarar o óbvio. O pastor passou todos os anos se consumindo pela culpa que não sabia confessar. A cada dia mais pálido e triste, tentando se redimir, conseguiu apenas deixar seus sermões no púlpito mais inflamados e aumentar a adoração dos fieis que passaram a considerá-lo um santo. Ao mesmo tempo passou a ser “cuidado”, mas principalmente vigiado de perto, pelo médico, imagine só! Chillingworth se fazendo de melhor amigo, mas todo desconfiado pela dor do pobre pastor. Só que o cara é um porre o livro inteiro! Por que diabos ele precisava fazer cara de desmaio e colocar a mão no coração a cada cinco minutos? Tudo bem, exagerei a cada dez, haha. Sinceramente não sei o que Hester – e todas a mulheres solteiras da cidade – viram nesse homem, mas..... GOSTO NÃO SE DISCUTE....
O livro é cheio de personagens carolas e supersticiosos, que julgam os mínimos atos alheios em público e guardam os seus entre quatro paredes. Nathaniel Hawthorne descreveu aquela geração como vinda de uma Inglatera gloriosa e cheia de festas, mas que não poderia representar mais do que cores pálidas da felicidade, nos momentos em que era permitido. E, ainda bem, ele não transcreveu os sermões do Dimmesdale, senão seria que eu desmaiaria por ter tido uma síncope, haha. Após muito sofrimento, causado pela sociedade largamente condenada por Hawthorne, a história sofre uma leve reviravolta. Mas os habitantes da cidade não eram capazes de acreditar no óbvio que estava bem debaixo de suas “fuças”, criaram-se várias teorias sobre o acontecido e cada um acreditou na verdade que mais bem convinha às suas crenças. Se pararmos pra prestar atenção não é um comportamento tão fora de moda.
Em resumo é um livro maravilhoso que merece mesmo o título de Obra Prima (que dá nome à coleção da qual faz parte). Nathaniel Hawthorne soube contar e descrever muito bem o cenário do qual era parte, com todas suas críticas. Mereceu minhas 5 estrelinhas!