Paula | @paulaisreading 07/12/2014Intenso e surpreendenteResenha originalmente publicada no blog Seção Reservada
O livro de hoje é especial de diversas formas. De autoria de um dos meus escritores brasileiros favorito, um livro inspirado em um podcast e lançado por uma editora bem restrita em seus títulos (e que nem por isso merecem menos mérito). Eu falei sobre o lançamento de A Lenda de Ruff Ghanor – O Garoto-Cabra em outro post, e nele você pode encontrar os áudio-dramas lançados de trechos do livro.
“Nos confins de uma terra governada pelo dragão Zamir, ergue-se um mosteiro. Um garoto selvagem, dotado de poderes misteriosos, é encontrado pelos monges. Seu nome é Ruff Ghanor. Treinado desde cedo pelo rigoroso prior, Ruff se encaminha para derrotar o tirano. Ruff enfrenta as forças de Zamir e precisa liderar seu povo no combate. Contudo, antes de vencer o dragão, ele descobrirá segredos sobre si mesmo e seu mundo.”
Antes de qualquer coisa, devo alertar: se não gosta de spoilers, NÃO LEIA A ÚLTIMA PÁGINA DO LIVRO. Na verdade, nem abra nessa página antes de realmente chegar ao final. Assim como ocorre em outro livro do Caldela, “O Crânio e o Corvo”, a frase final é totalmente arrasadora e não deve ser lida antes se você quer ter a experiência completa da leitura. Aviso isso porque conheço muitas pessoas que possuem essa maluca e estranha mania.
Apesar de impactante, a frase final não é nada sem todo o desenvolvimento extraordinário da trama. Logo nas primeiras páginas Caldela já conquista com personagens carismáticos, inclusive os secundários, e uma narrativa que prende a atenção do leitor devido ao seu ritmo acelerado, com muitos anos sendo contemplados nos primeiros capítulos, abrangendo o crescimento de Ruff Ghanor.
O personagem principal, aliás, é outro ponto forte. Seu passado misterioso intriga, mas persistência impressiona. A medida que vamos descobrindo mais sobre sua história, e também sobre outras histórias, como a do fantástico prior, mergulhamos ainda mais no universo criado nos episódios de RPG do Nerdcast e expandido pela habilidade de Caldela.
“São eles ou você – repetiu Ruff – Você disse que queria aprender a matar. Só tem que saber que são eles ou você. Ou você mata, ou morre. Não pode segurar. Não hesite. Matar as criaturas foi simples. Eu rasguei sua pele, cortei seu estômago. Porque não tinha opção.”
A trama principal é de tirar o fôlego, mas os dramas de cada personagem também são dignos de nota. Áxia e sua história sofrida, sendo perseguida e odiada apenas por ser quem é, e pela família que possui, nos fazem questionar inclusive os preconceitos existentes na sociedade atual. Inclui-se aí seu irmão que possui algum tipo de deficiência mental, e sofre ainda mais, pois isso não era compreendido pela população em geral, nem mesmo por aqueles com mais conhecimento, como os clérigos.
“- Por que eles odeiam você?
Ela deu de ombros.
- Eles apenas odeiam. Eu sou só um alvo.”
Ainda nesse contexto, o paralelo de diversos acontecimentos no livro com situações reais é bem interessante, e a quebra de alguns paradigmas de histórias medievais clássicas também, como clérigos casados (ou mulherengos) e mulheres do clero responsáveis pelo treinamento em armas. E tudo isso é inserido de forma totalmente natural no texto, o que capturou ainda mais minha atenção.
“- Ajude-me, Korin. Ajude-me. Preciso de sua força.
- Ainda bem que você notou isso, seu idiota. Não vou deixa-lo sozinho, você morreria em dois minutos!
Abraçaram-se forte.”
Outro ponto que me marcou na história é a amizade de Ruff e Korin. Muitos livros mostram amigos inseparáveis, mas poucos conseguem me emocionar com tamanho senso de lealdade e dedicação. Apesar de Korin ser comparativamente mais fraco (na questão física e em poder mágico) do que Ruff, sua força de caráter impressiona, e algumas de suas falas mais egoístas apenas o tornam mais humano. A empatia com o personagem foi imediata, para mim. Ele também é o alívio cômico nas situações de tensão, e eu sempre me encanto com personagens que fazem piadas até nas piores situações.
“Ruff Ghanor, dentro do mosteiro, ouviu o comando e saltou de pé, como se estivesse a vida inteira esperando por aquilo.
E, na verdade, estava.”
Por fim, ressalto que não é mesmo necessário ouvir a trilogia de podcasts de RPG do Jovem Nerd para compreender a história. Meu entendimento foi total, e ainda não ouvi (shame on me). A edição do livro é primorosa, já um padrão da Nerdbooks, com o título em relevo, arte linda na capa e folhas de papel pólen espesso. Um livro que vale pena ter na estante, assim como todos os outros de Leonel Caldela. Ah, e lembrando que esse livro é o primeiro volume de uma trilogia! Muito mais vem por aí!
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