lfcardoso 23/05/2009
Sátira à condição humana
“Discuti com o autor os pormenores da trama e a reli; não me parece uma precisão ou uma hipérbole qualificá-la de perfeita.” Essa afirmação é de Jorge Luis Borges sobre o livro A invenção de Morel e faz parte do prólogo da obra. Além do texto de Borges, a edição brasileira tem como posfácio a crítica de Otto Maria Carpeaux, publicada originalmente no Suplemento Literário de O Estado de S. Paulo, de 26 de março de 1966. A presença dos textos de dois grandes nomes da literatura reforça a qualidade do livro de Bioy Casares. É com esta fantástica obra que a editora Cosac Naify iniciou a coleção Prosa do Observatório, coordenada pelo crítico e escritor Davi Arrigucci Jr., que reúne textos de ficção e ensaios de escritores hispano-americanos e brasileiros.
E qual seria a trama desse fantástico romance? Escrita em forma de diário, é contada a história de um fugitivo político venezuelano que se abriga no arquipélago Ellice, no oceano Pacífico, foco de uma terrível doença que “mata de fora para dentro”. Lá em meio a casas abandonadas e máquinas misteriosas, o fugitivo encontra um grupo de turistas que nada em piscinas cheia de sapos e cobras e, principalmente, ignora a sua presença. Mas o isolamento e a insegurança não impedem que o venezuelano se apaixonem por uma das mulheres do grupo, Francine.
Com o decorrer da história, o protagonista descobre a razão pela qual a sua existência é ignorada. Isso está ligado à uma espécie de supervitrola, inventada por Morel (homenagem do autor ao doutor Moreau, personagem de H.G. Wells). O cientista é fascinado pela idéia de imortalidade e seu invento está ligado à essa fascinação. Movido pela paixão, o fugitivo resolve estudar o funcionamento da prodigiosa máquina, mesmo ciente dos riscos a que ficará exposto.
A invenção de Morel é um livro atual, mesmo sendo escrito na década de 1940, pois aborda temas que estão presentes ainda hoje: a fé cega na tecnologia e o desejo do homem de se igualar e superar Deus. Carpeaux encerra o posfácio com a seguinte frase: “A invenção de Morel é uma sátira. Mas o objeto da sátira não é a técnica e, sim, a condição humana. Pois assim como o fugitivo de Bioy Casares temos todos nós a escolha, apenas, entre a morte pela peste e a prisão na vida - até a morte.”
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