Naty__ 13/03/2020Li "Depois daquela montanha" em 2016 e ainda não me sinto preparada para resenhá-lo, pois, por mais que eu diga tantas coisas sobre ele, ainda não será o suficiente para demonstrar tudo o que merece.
É difícil explicar e até mesmo entender, mas logo nas primeiras páginas eu já imaginei o final. SIM, eu acertei o final do livro (sem as justificativas, é claro) e mesmo assim a obra me arrebatou. Achei que seria tragada pelo estrago, devorada pela decepção e inspiraria desgosto por imaginar que a história seria “só” isso.
Engana-se quem pensa isso. SIM, eu estava enganada sobre não gostar. Mesmo adivinhando o desfecho, é impossível não sentir os olhos lacrimejando, não sentir como a leitura é capaz de nos ensinar, nos mostrar que nem tudo pode ser como queremos, que nem tudo somos capazes de decidir pelos outros e que nem sempre as nossas armas serão usadas da melhor forma.
A gente tem a mania de achar que tudo precisa ser como queremos ou que o melhor é o que pensamos. Depois daquela montanha nos ensina que não. A outra pessoa tem a sua escolha, o seu poder de decidir se quer ir ou ficar, se quer chegar ou não. E é assim que eu deveria iniciar esta resenha: Ben Payne e Ashley decidem ir, mas não são apenas essas as decisões presentes no livro.
Ben é um médico ortopedista e está tentando voltar para casa, pois tem algumas cirurgias a fazer. Porém, algo inevitável acontece: uma forte tempestade castiga a região e o voo do doutor está bastante atrasado. Ele é casado há quinze anos com a doce e encantadora Rachel, uma mulher que é capaz de enxergar o que Ben tem de melhor e fazê-lo uma pessoa apaixonada por sua profissão, sua família e por tudo ao seu redor. Durante todo o percurso, ele carrega um gravador para poder relatar os fatos à esposa.
Em contrapartida demos Ashley, a noiva ansiosa que está com o casamento marcado. No aeroporto ela conhece Ben e passam a conversar um pouco enquanto esperam o voo. Ao embarcarem, são avisados de que aquele voo não pode acontecer pois o clima não está favorável e pode ser muito arriscado. Decepcionados, eles saem e cada um decide seguir o seu caminho.
É nessa hora da pressa e do desespero que eles decidem agir – e estamos lidando com mais uma decisão capaz de mudar suas vidas. Ambos embarcam em um avião com Grover e seu cachorrinho Napoleão e o pior ainda pode acontecer...
Ao acordar, Ben nota que está coberto de neve; o vento corta sua pele e ele sente uma dor forte nas costelas. Ashley está ao seu lado com o ombro deslocado e a perna quebrada. Tudo parece um grande pesadelo, se não fosse as dores que insistem em incomodá-lo. O que fazer quando o socorro está longe de ser um objetivo, quando a solidão parece queimar seus corações e o gelo interminável parece invadir seus corpos? O que fazer quando há apenas um (com fraturas) e tendo de tomar conta de uma doente?
A obra toma um rumo que o leitor não imagina e os personagens precisam lidar com a necessidade de sobreviver no frio, a quase 3.500 metros de altitude, com fome, muitas vezes com sede e sem medicamentos adequados para sarar as suas dores. Como Ben deve fazer para sair dali sem agravar o estado de Ashley?
O protagonista tem duas opções: carregá-la com a perna fraturada e o ombro deslocado, estando em péssimas condições por causa de sua costela ou simplesmente deixá-la morrer congelada. É difícil imaginar que uma vida está em nossas mãos e que temos o poder de tentar deixá-la viva ou matá-la de forma tortuosa.
Embora algumas coisas pareçam fora dos conformes, fora da lógica e da realidade, o livro é impactante. Mesmo com alguns pontos negativos, inclusive uma parte que não posso explicar porque seria spoiler, ainda dei cinco estrelas à obra. A capa está condizente com o cenário e achei marcante. A diagramação segue o padrão simples, mas que proporciona uma leitura agradável. Ao finalizar, fechei o livro com uma lágrima dos olhos e com o sentimento de que precisava relê-lo muito em breve. É necessário recomendar depois de tudo isso?
Quotes:
“– [...] Estamos casados há muito tempo, vimos muita coisa, vivenciamos muita coisa, mas amar é algo que vai melhorando, quanto mais a gente ama. Talvez vocês pensem que um velho como eu não se inflama quando ela cruza o quarto com uma camisola desbotada de flanela, mas eu me incendeio. E ela também sente o mesmo por mim. [...] Apesar de eu não usar camisolas de flanela. Ela pode não ser tão atrevida quanto era na casa dos 20 anos – prosseguiu – e pode ser que tenha a pele flácida na parte posterior dos braços e na base do bumbum. Talvez tenha umas rugas de que não gosta, talvez tenha as pálpebras caídas, talvez sua roupa de baixo não seja tão pequena quanto já foi; pode ser que tudo isso seja verdade... mas também não tenho a aparência do homem das nossas fotos do casamento. Sou uma espécie de reflexo daquele garoto, um reflexo grisalho, enrugado, curtido pelo sol e mais lento. Talvez isto seja meio lugar-comum, mas me casei com a mulher que se encaixa em mim. Sou metade de um quebra-cabeça de duas peças.” (p. 37)
“Muito do que eu sou foi ele quem fez. Forjou-o em mim. Sei disso. Mas meu pai usava dor para me livrar da dor. E me deixava vazio e ferido. Você se derramou em mim e me preencheu até a borda. Pela primeira vez, não senti dor. Você me deu a única coisa que ele nunca ofereceu. Um amor que não dependia de cronômetro.” (p. 53)
“– Paus e pedras podem quebrar ossos, mas, se você quiser ferir alguém... bem fundo, use palavras.” (p. 219).
site:
http://www.revelandosentimentos.com.br/2016/11/resenha-premiada-depois-daquela-montanha.html