Kamyla.Maciel 18/05/2023
Eliana é sensacional, isso não há o que questionar! Ler esse livro me transportou ao Rio de Janeiro do mesmo jeito que Um Defeito de Cor me levou a Salvador, foi uma surpresa porque eu desconhecia o Valongo e o que representou.
O livro fala do Rio de Janeiro de 1800, em que ocorreu o assassinato de um homem branco que passa a ser investigado. Só que esse crime traz questões muito maiores, questões coletivas e sociais, e Eliana vai ligando os fatos e apresentando os personagens através dessa investigação.
São dois narradores, a escravizada Muana e um homem brasileiro livre, o Nuno, que ficam intercalando os capítulos. São personagens diferentes e essa diferença dá um tom mais leve ao livro, nas partes narradas por ele. Muana é incrível, uma mulher preta que nos conta sua vida desde África, com muita muita ancestralidade e consciência.
Ler esse livro depois de ter lido ?solitária? foi perfeito, concretizar através de personagens tão reais a escravidão e suas mazelas e como isso gerou o cenário de servidão das empregadas domésticas no outro livro. É como se um complementasse o outro.
São histórias não contadas que Eliana traz de forma clara, é o Rio de Janeiro aos olhos de quem estava à margem e não com aquela pompa que se conta sempre sobre a corte no Brasil.
É a formação histórico social do nosso país, de um lado um luxo e desperdício e a ideia de embranquecimento e eurocentrismo, do outro a fome, a miserabilidade dos corpos, a necessidade de sobreviver e resistir.
Entendi que o crime que o titulo fala não é aquele investigado no livro, mas sim a escravização e morte de milhares de pessoas negras trazidas da África e o total descaso e esquecimento com que isso foi tratado depois. O livro é um chamado para não esquecermos, para relacionar os problemas de hoje às atrocidades daquela sociedade. É um chamado a resistir, a entender a formação social do Brasil, a deixar de ter uma única versão da história.
Vi uma entrevista da Eliana e ela fala que escrever esse livro era uma necessidade de contar o que não era contado, de devolver dignidade para quem construiu o Brasil, de mostrar a narrativa de uma mulher negra, um resgate através da literatura.
Enfim, perfeito!! não tem como largar quando começamos.