O Garrancho 24/03/2023
Na sombra de Agatha Christie
Agatha Christie nos deixou, exatamente, no dia 12 de janeiro de 1976 e sua vasta e aclamada obra, mesmo após mais de 47 anos, segue eternizando o nome e o talento da Dama do Crime. Ainda que tenha sido influenciada por medalhões do romance policial, como Sir Arthur Conan Doyle e Maurice Leblanc, a escritora inglesa alcançou (e ainda em vida) um sucesso imensurável, o que se traduz até hoje no número sempre ascendente de exemplares vendidos em suas incontáveis reedições.
Por isso, compreendo como praticamente impossível a missão de autores que, fãs de La Christie, tentam em seus livros se aproximar, nem que seja um tantinho, do poder que as histórias protagonizadas ou por Hercule Poirot, ou por Miss Marple exercem em nós, leitores.
Tudo isso para contextualizar, de certa forma, minhas impressões da leitura de “O desaparecimento de Stephanie Mailer”, de Joël Dicker.
Dele eu já tinha lido “A verdade sobre o caso Harry Quebert” e esse primeiro contato com sua literatura me arrebatou de tal modo que me senti motivado a conhecer seus outros escritos.
Não, eu não me arrependo de ter lido “O desaparecimento de Stephanie Mailer”. Agora, que esse dispendioso calhamacinho me frustrou em determinados pontos, isso eu não tenho como negar.
Trata-se de uma trama policial em que seus inúmeros personagens buscam elucidar (ou ocultar) a verdade sobre uma chacina ocorrida 20 anos antes numa cidadezinha do interior de Nova York. No passado, os neófitos investigadores Jesse Rosenberg e Derek Scott encontram um culpado, mas, graças à jovem e talentosa jornalista Stephanie Mailer, duas décadas depois a investigação é reaberta.
Para não me alongar nas gritantes escorregadas que Dicker dá nessa sua prolixa narrativa, eu destaco a cansativa quantidade de reviravoltas – os famosos “plot twists” –, que mais tonteiam e enfadam do que divertem. Uma pena. Além disso, preciso registrar, sem spoiler, é claro, que o autor suíço peca na construção de personagens caricatos – sobretudo quando estes são idosos – e no aprofundamento de dramas individuais que mais nos despertam maus sentimentos do que qualquer outra coisa. E isso irrita porque, ao fim, é perceptível que todos aqueles pormenores, numa tentativa de humanização exacerbada, só serviram para encher linguiça.
Não sou de abandonar livros, mas não condeno quem o faça. (Há tantos livros maravilhosos que queremos tanto ler, não é mesmo?). Lendo “O desaparecimento de Stephanie Mailer”, pude mais uma vez, quem sabe, constatar o quão árduo é fabular e escrever para superar uma obra de êxito, como “A verdade sobre o caso Harry Quebert”, ou para seguir surfando uma onda que parece infinda como a da inesquecível autora de “E não sobrou nenhum” e de dezenas de outras joias da sua memorável literatura de entretenimento universal.
Fora tais deslizes, o que vale mesmo aqui é o passatempo e a possibilidade de acompanhar de perto a trajetória de um badalado escritor, que – evidentemente – não está isento nem de elogios nem de críticas.
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