Jessica Becker 13/01/2017Eu Mato " - Até nisso nós somos iguais. A única coisa que nos diferencia é que, quando acaba de falar com elas, você tem a possibilidade de se sentir cansado. Pode ir para casa e desligar a mente e todas as suas doenças. Eu não. Eu não consigo dormir de noite, porque meu sofrimento nunca acaba.
- E nessas noites, o que faz para se livrar do seu sofrimento?
- Eu mato..."
Sejamos sinceros: o trecho transcrito na contracapa do livro Eu Mato, de Giorgio Faletti, atrai qualquer fã de romances policiais. Foi o que aconteceu comigo e creio que tenha acontecido com vários outros leitores do gênero. Mas, apesar das muitas críticas positivas que li a respeito e da sinopse interessantíssima, a obra mostrou-se clichê e decepcionante.
Lançado no Brasil em 2010, o livro de estreia de Faletti narra a caçada a um serial killer, em Montecarlo, no glamoroso Principado de Mônaco. Para aqueles que, assim como eu, gostam de se situar na história, o Principado de Mônaco é o segundo menor país do planeta e está localizado na Riviera Francesa, fazendo fronteira com a França e com o Mar Mediterrâneo. É lá onde vive o maior número de bilionários e milionários per capita, pois é um famoso paraíso fiscal. Os impostos corporativos são baixos, o jogo é legalizado e não existe imposto de renda. Isso tudo, somado à belíssima paisagem, tem atraído empresários, celebridades e refugiados fiscais. Além disso, no Principado fica localizado um dos principais circuitos de Fórmula 1: o circuito de Mônaco.
"Percebe que está morrendo, que alguém a está matando sem que lhe seja concedido nem saber o porquê. De seus olhos escorrem salgadas as lágrimas de lamento que vão se confundir com as milhares de gotas anônimas no mar indiferente que a envolve." (pág. 41)
Foi nesse contexto que o assassino de Eu Mato, também conhecido como Ninguém, elegeu suas primeiras vítimas: um piloto de Fórmula 1 e sua namorada, uma americana campeã de xadrez. Conforme vai selecionando seus próximos alvos, ele telefona para o programa Voices, apresentado pelo carismático Jean-Loup Verdier em uma rádio local, e propõe enigmas envolvendo música. Se solucionados, tais enigmas levarão diretamente à próxima vítima.
"Embora dourada, uma gaiola é sempre uma gaiola, e cada um é artífice do próprio destino. Cada um construía, ou destruía, a própria vida segundo as regras que impunha a si mesmo. Ou as regras que se recusava a impor." (pág. 71)
Do ponto de vista de uma pessoa acostumada a ler romances policiais, o livro é frustrante. Para começar, um clichê. O detetive que auxilia nas investigações é um americano, agente do FBI, que passou por um grande trauma e que está lidando com a pior ocorrência de sua carreira. Será que é possível (agora a crítica não se refere a apenas esse, mas sim à maioria das obras do gênero) uma história em que o policial não seja um americano lidando com o caso mais angustiante de sua vida ou que não esteja se recuperando de um grande choque? Só para variar um pouco. Outro fato que me deixou desapontada foi a quantidade de pessoas assassinadas. O livro tem 536 páginas, com letra miúda, e pouquíssimos assassinatos. Isso tornou a leitura um pouco maçante.
"(...) Outros homens ganhavam a vida fabricando e vendendo minas, e, no Natal, levavam presentes para seus filhos, à custa de matar e estropiar outras crianças. A consciência era um acessório cujo valor estava ligado às flutuações do preço do barril do petróleo." (pág. 75)
Mas não existem somente pontos negativos nesta obra. A identidade do assassino, bem como o seu modus operandi, o porquê ele mata e sua história de vida foram brilhantes. Tudo muito bem explicado, sem deixar dúvidas. Além disso, a escrita de Faletti é poética e levanta reflexões em diversos momentos sobre o verdadeiro valor do dinheiro.
Apesar dos pontos negativos, essa obra é uma leitura válida para os amantes dos romances policiais e recomendado para quem quer ingressar nesse gênero. Para que o leitor não se frustre, como aconteceu comigo, basta ele não esperar muitos assassinatos nem um investigador muito diferente dos que estamos acostumados a encontrar:
site:
https://acervodajess.wordpress.com/2017/09/24/resenha-12-eu-mato/