Moreira 03/09/2020
Viagem, viagem e mais viagem. Para corações insensíveis - isto é, aqueles que não possuem sensibilidade o suficiente - o livro poderia se resumir nessa frase composta pela enfática repetição dessa adorável palavra. Poderia parar por aqui e tudo bem, não estaria errado em resumir assim as mais de 300 páginas do livro. Só que eu estaria sendo superficial. Profundamente superficial - antagonicamente falando.
O livro conta a história de Sal Paradise, um jovem, sedento por liberdade, amante da estrada e com uma incrível sensibilidade para captar a beleza de cada momento. Não só isso, é também a história da vultosa admiração de Sal por Dean, um rapaz que conhece logo no início da narrativa e que se torna seu melhor amigo. Sal desbrava as estradas americanas, pegando carona com todos os tipos de pessoas, conhecendo lugares, garotas e descrevendo seus profundos e poéticos pensamentos a respeito de suas sensações. Sei que o autor escreveu o livro em apenas três semanas, entorpecido de benzedrina, mas talvez a droga - longe de mim, que nunca botei um cigarro na boca fazer apologia - tenha aflorado sua mais romântica visão da vida. O livro é repleto de parágrafos intermináveis, mas com um particular tato para o poético que emana de cada palavra. Sal caminha por ruas acizentadas, fábricas com paredes de tijolo, poças d?água na sarjeta e mendigos na calçada; escala montanhas, admira a beleza do Pacífico, atravessa o deserto e toda sua sequidão, se apaixona e desapaixona, convive com os constantes momentos de despedidas, admira as estrelas longínquas e a inocência dos índios mexicanos, mas absolutamente, a todo momento só consegue pensar em seu grande amigo, Dean.
Para quem espera uma leitura com acontecimentos fantásticos e desenrolares inesperados a todo momento, esqueça! Essa é uma história real, com personagens inspirados em pessoas e acontecimentos reais. É um livro para quem sabe apreciar a vida, para quem lê com o coração quase saltando e suas veias se dilacerando pela vontade de viver. Não ?viver?, no sentido vazio da palavra; ?Viver? com V maiúsculo. Jack Kerouac influenciou toda uma geração de jovens. Expressou de maneira esplêndida todos os seus anseios e gritou para todo o mundo o seu grito da imortalidade. Aquela imortalidade literária que faz com que as palavras conservem uma vida que desfalece com o tempo e não pertence mais ao espaço físico. Que brilhante obra; sublime.
Essa é uma história de viagem, de contracultura, de liberdade, mas acima de tudo, de amizade verdadeira. É um livro que te deixará com uma vontade enorme de pedir demissão do emprego, pegar a mochila e sair devorando tudo o que esse mundão pode te oferecer, mas também te trará a sensação de que nada do que você possa viver será tão interessante se não tiver um grande amigo do lado para compartilhar, e participar e entender suas loucuras.
No fim, Dean foi embora, naquela noite fria, depois de atravessar 5 mil km apenas para ver Sal e se despedir de uma maneira que nos deixa com o coração apertado e um certo nó na garganta. Mas tudo bem, os anos VIVIDOS construíram a eternidade juntos, em papel e em nossa imaginação. E como diria Barney Stinson: ?Não importa o que você faça na vida, não vai ser lendário a menos que seus amigos estejam lá para ver?. No final, de maneira espetacular, nos presenteia com dois inadjetiváveis parágrafos que fecham com chave de ouro.
Para mais resenhas como essa, siga o @resenhafajuta. Ainda estamos começando, mas tudo teve um começo, não é mesmo?