Ivandro Menezes 23/05/2021
Uma mulher, Kim Jiyoung
Kim Jiyoung, uma mulher comum na casa dos trinta anos de idade, é uma entre tantas outras. É a partir desse incidente em que diz ser outra pessoa que somos apresentados a sua biografia.
Desde a infância até a vida adulta percorremos episódios que revelam a dinâmica familiar e, sobretudo, os desafios de ter nascido mulher na Coréia. Há uma obsessão e subserviência aos filhos homens, o graal e o alvo de todas as esperanças e anseios familiares.
Kim Jiyoung enfrenta os desafios para estudar, se formar, entrar no mercado de trabalho e se destacar, num ambiente hostil, depreciativo e causticante, marcado por assédios e pequenas humilhações. Contudo, no momento em que tem uma filha se vê obrigada a abandonar para ser mãe e dona de casa em tempo integral.
Se a sinopse faz parecer uma história simples e banal é porque, em certa medida, nos soa familiar. Porém, o romance que segue esse enlouquecimento da protagonista revela-se incômodo, constrangedor e demasiado realista.
Uma personagem discreta e densa, pintada em tons pastéis, colabora para o clima imersivo, quase sufocante, e as referências (notícias, estatísticas e pesquisas) vão dando ora um tom de relato-reportagem, ora um tom de ficção, que entretem e choca num só momento.
O romance tem um ritmo constante, o qual pode ser cansativo em um ou outro momento, mas, por isso mesmo, não faz perder o interesse. Os cortes fazem com que os episódios soem como um quebra-cabeça, e a essa forma narrativa ganha explicação no lugar em que somos jogados no último capítulo.
Um libelo contra a desigualdade gênero na Coréia do Sul, mas que encontra ecos aqui e em outros tantos lugares. De modo objetivo e claro Cho Nam-joo dá a Kim Jiyoung esse nome e tantas vidas que cabem nele.